TEMER ATENDE PEDIDO DE ENTIDADES E VETA ‘TREM DA ALEGRIA’ NO BANCO CENTRAL

O Presidente Michel Temer vetou o artigo 55 do Projeto de Lei de Conversão nº 16, de 2017 (Medida Provisória nº 765, de 2016), que alterava de nível médio para nível superior o requisito de escolaridade para ingresso no cargo de técnico do Banco Central. Para justificar o veto, Temer recorreu à decisão do Supremo Tribunal Federal na ação direta de inconstitucionalidade nº 5.127 contra inclusão de emendas sobre matérias estranhas ao conteúdo de medidas provisórias, os chamados "jabutis" ou emendas de "contrabando".

O veto atende o pedido da AUD-TCU, ANTC e entidades que representam Analistas do Poder Judiciário e da Câmara dos Deputados. No dia 2 de junho, as entidades enviaram carta aberta ao Presidente por meio da qual pediram o veto da proposta. Além de articulações com diversos órgãos da área econômica do Poder Executivo, as entidades protestaram com faixas em frente ao Palácio do Planalto durante todo dia de ontem, pressionando pelo veto.

De acordo com as entidades, o requisito de investidura é um dos componentes constitucionais do sistema remuneratório que, ao lado da natureza jurídica e da complexidade das atribuições do cargo, tem por finalidade assegurar uma equação ajustada e realista entre as responsabilidades exigidas dos cargos e a remuneração percebida pelos agentes que ocupam.

A AUD-TCU e a ANTC reconhecem que há entidades que defendem a alteração do requisito de investidura sem considerar que este é um dos componentes do sistema remuneratório, conforme foi declarado ao Jornal Correio Braziliense em reportagem recente:

 

“A diretoria do BC, comandada por Ilan Goldfajn, trabalha para que o artigo 55 seja mantido. “Cada vez mais, as atribuições e os desafios postos ao BC evoluem em complexidade, o que demanda a atuação de servidores cada vez mais bem capacitados. Nesse sentido, o nível superior para os especialistas que atuam no BC é desejável”, disse ele ao Correio, por intermédio da assessoria.

Goldfajn respondeu ao Correio antes de o Sintbacen, sindicato dos técnicos do banco, promover, ontem, ato público cobrando dele postura de apoio mais firme perante o governo. Além de antigo, o pleito da diretoria do BC é reforçado num momento em que a autoridade monetária vem sendo bem sucedida no controle da inflação.

A pressão a favor da manutenção do artigo 55 vem também da Unacon Sindical, que reúne auditores e técnicos federais de finanças e controle (Tesouro Nacional e da Controladoria Geral da União). A Unacon enviou carta ao Planalto apoiando a preservação do artigo.

Mesmo entre associações de auditores de tribunais de contas, a questão divide opiniões. A Auditar, que representa a maior parte dos auditores do TCU, e a Fenastc, associação de técnicos e de auditores de tribunais de contas de todo o Brasil, não chegaram a se pronunciar oficialmente sobre o BC. Mas não veem problema na maior exigência de escolaridade para ingresso em carreiras de apoio na administração pública.

Divisões

A diferença salarial entre técnicos e analistas do BC vai de R$ 10 mil a R$ 13 mil. Luciene Pereira da Silva, presidente da AUD-TCU, alerta que a elevação do cargo de técnico para nível superior “criará ambiente para equiparações salariais futuras”, com “impactos incompatíveis” com o novo regime fiscal, que impõe teto para os gastos públicos. Ela destaca o “elevado potencial de efeito multiplicador da medida. Se não houver veto no caso do BC, acredita, ficará mais difícil barrar outras carreiras que buscam o mesmo, a exemplo dos técnicos do próprio TCU.

“O veto é totalmente descabido. O pleito do BC é legítimo”, rebate Rudinei Marques, presidente da Unacon. Ele admite que demandas por equiparação salarial podem até existir, mas diz que isso não é desculpa para deixar de atender a uma necessidade do BC. Ele cita como exemplo a criação do cargo de analista tributário na Receita Federal. A diferença salarial entre analistas e auditores da Receita persiste, embora os primeiros tenham tentado, sem sucesso, a equiparação.

Jordan Pereira, presidente do Sinal, sindicato dos analistas e técnicos do BC, informa que existe consenso entre as duas categorias de que os salários não podem equiparar, embora a diferença deva diminuir. E pondera que a existência de demandas por melhores salários independe do nível de escolaridade exigido nos concursos.

A mudança no requisito de ingresso para técnicos tem parecer favorável da Procuradoria do BC, que analisou, inclusive, a possibilidade de a medida ser alvo de ação de inconstitucionalidade da Procuradoria Geral da República, como foi a transformação do antigo cargo de técnico do Tesouro Nacional, de nível médio, em cargo de analista tributário da Receita Federal, de nível superior. A procuradoria do BC entende que a mudança pretendida pela instituição é diferente porque não implica transformar o cargo de técnico em outro cargo; apenas exige escolaridade superior para o próprio cargo nos próximos concursos.”

Trem da alegria

Além de risco fiscal, a AUD-TCU e a ATNC veem inconstitucionalidade no artigo 55. Segundo Luciene Pereira, pessoas aprovadas em concurso para cargo de nível médio passarão a ocupar, sem novo concurso, cargo de nível superior. Isso afronta a Constituição Federal e caracteriza “trem da alegria”, diz ela. Para ela, o certo seria colocar os atuais técnicos do BC num quadro em extinção, que duraria até o último deles se aposentar. Mas o PLV não faz isso. Os técnicos que fossem aprovados em concursos já com exigência de curso superior entrariam em outro quadro, com denominação diferente e que os antigos teriam que disputar se não quisessem ficar no quadro em extinção”.

"Não podemos ficar apenas no discurso de que defendemos a previdência dos servidores que exercem atividades exclusivas de Estado, precisamos ter uma ação efetiva e coerente nessa defesa", declarou Lucieni Pereira, Presidente da Associação da Auditoria de Controle Externo do Tribunal de Contas da União (AUD-TCU) e Diretora da Associação Nacional dos Auditores de Controle Externo dos Tribunais de Contas do Brasil (ANTC).

As entidades permanecem vigilantes e já deliberaram que atuarão contra todas as propostas em sentido semelhante. Para isso, buscam parceria com outras associações nacionais que defendam uma gestão administrativa segundo preceitos constitucionais e que não comprometam o equilíbrio do regime próprio dos servidores civis, que sofrerão a 4ª Reforma da Previdência."O trem da alegria tem impacto direto no regime próprio, pois o aposentado no cargo de nível médio será beneficiado por equiparações salariais futuras", explicou Lucieni.

As Associações também esperam que o Supremo Tribunal Federal coloque um freio nesse tipo de investida, que tem impacto direto na previdência do servidor público. O ministro Marco Aurélio é o relator do Recurso Extraordinário nº 740.008, que discute a constitucionalidade de lei do Estado de Roraima sobre o tema, já tendo sido reconhecida a repercussão geral. Em artigo jurídico, o Procurador do Distrito Federal Carlos Alencar Carvalho esclarece: “o que a jurisprudência tem apontado é a viabilidade de agrupar sob uma mesma denominação os cargos cujas atribuições, requisitos de qualificação, escolaridade, remuneração, habilitação profissional ou especialização exigidos para ingresso sejam idênticos ou essencialmente similares”.

Para Lucieni, o veto de Temer é um freio necessário a outras propostas, que, se aprovadas, vão criar um ambiente de pressões políticas para equiparações remuneratórias futuras, com impactos não apenas no plano orçamentário e fiscal, mas também com impacto na previdência do regime próprio de todos os servidores públicos do ente da Federação. A representante concorda com o Procurador do Distrito Federal, no sentido de que alteração do requisito de investidura com aproveitamento dos servidores ativos e extensão de eventuais equiparações aos inativos é inconstitucional.

Lucieni ressalta que em 2011 Técnicos do TCU já tentaram equiparação salarial com os Auditores de Controle Externo no Mandado de Segurança nº 30.692 impetrado no STF. No Poder Executivo federal, também há pleitos semelhantes, com ações na Justiça Federal que demonstram haver uma clara intenção de servidores de nível médio do controle interno e da previdência de alcançarem a equiparação salarial com os cargos de nível superior. A representante também chama a atenção para o anteprojeto de lei que tramita no Tribunal de Contas da União, cuja proposta em análise, na prática, transfere atribuições dos atuais cargos administrativos de nível superior para cerca de 900 Técnicos que atualmente ocupam cargo de nível médio. Veja o diagrama divulgado no site de notícia da ANTC!





O diagrama demonstra como os atuais cargos de nível médio do TCU serão transformados para o desempenho de atribuições que hoje são exercidas por 200 servidores administrativos concursados para atividades de nível superior. A ANTC e a AUD-TCU seguem confiantes que os Ministros do TCU não aprovarão a proposta que compromete a credibilidade do órgão que se notabilizou, ao lado do STF, na defesa da regra do concurso público específico, por meio das fiscalizações da legalidade dos atos de pessoal realizadas em cumprimento ao dever constitucional incumbido ao TCU.


Veja outras reportagens sobre essa proposta de ‘trem da alegria’ pelo Bacen:
Denúncia de trem da alegria;
Suposto trem da alegria no Banco Central custará R$ 150 milhões ao ano;
Técnicos pressionam presidente do Banco Central;
Técnicos do BC repudiam a acusação de trem da alegria;
Nota em resposta ao SinTBacen.


Fonte: Associação da Auditoria de Controle Externo do TCU | Aud-TCU.

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