DECLARAÇÃO DE BRASÍLIA EM DEFESA DA PADRONIZAÇÃO DOS TRIBUNAIS DE CONTAS DO BRASIL

O I CONGRESSO NACIONAL DOS AUDITORES DE CONTROLE EXTERNO (CONACON), realizado pela Associação Nacional de Auditores de Controle Externo dos Tribunais de Contas do Brasil (ANTC) e suas Associações afiliadas, entre 8 e 10 de novembro de 2016, no Auditório do Tribunal de Contas do Distrito Federal, em Brasília;

CONSIDERANDO que os Tribunais de Contas consistem em instituições de auditoria externa perante órgãos e entidades da Administração Pública, conforme diretriz estabelecida pela Declaração de Lima da Organização Internacional de Instituições Superiores de Auditoria (Intosai), Seção 3;

CONSIDERANDO que a Declaração de Lima da Intosai, em sua Seção 1, esclarece que o “conceito e estabelecimento da auditoria são inerentes à gestão financeira pública, já que a gestão de recursos públicos envolve um voto de confiança”;

CONSIDERANDO que a referida Declaração prevê, ainda, que a “auditoria não é um fim em si, e sim um elemento indispensável de um sistema regulatório cujo objetivo é revelar desvios das normas e violações dos princípios da legalidade, eficiência, eficácia e economia na gestão financeira com a tempestividade necessária para que medidas corretivas possam ter tomadas em casos individuais, para fazer com que os responsáveis por esses desvios assumam a responsabilidade por eles, para obter o devido ressarcimento ou para tomar medidas para impedir - ou pelo menos dificultar - a ocorrência dessas violações”;

CONSIDERANDO a deficiência do atual marco normativo brasileiro para assegurar o mínimo de padronização na organização e funcionamento dos 34 Tribunais de Contas para o exercício uniforme do controle externo na Federação brasileira;

CONSIDERANDO que as práticas de provimento derivado e de desvio de função verificadas em Órgão de Instrução dos Tribunais de Contas do Brasil, incumbido da execução da auditoria externa nos órgãos e entidades da Administração Pública, constituem um dos principais fatores críticos para a efetividade do controle externo, uma vez que tornam vulneráveis as decisões das Cortes de Contas e comprometem a credibilidade das referidas instituições;

CONSIDERANDO que os desvios de função verificados no Órgão de Instrução dos Tribunais de Contas maculam as auditorias externas realizadas em órgãos e entidades da Administração Pública e comprometem a imparcialidade e a legitimidade das decisões proferidas pela instituição de controle externo, com reflexos diretos sobre a eficácia da Lei de Responsabilidade Fiscal e a Lei da Ficha Limpa, comprometendo as ações de prevenção e combate a desvios e à prática de corrupção;

CONSIDERANDO os avanços jurisprudenciais concretizados pelos Tribunais brasileiros, sobretudo pelo Supremo Tribunal Federal, que não reconhecem como legítima qualquer forma de provimento derivado nos cargos efetivos nos órgãos e entidades da Administração Pública brasileira, os quais resultaram na Súmula Vinculante nº 43;

CONSIDERANDO que o Objetivo do Desenvolvimento Sustentável 16 (ODS 16.5), da Agenda 2030 das Nações Unidas, exorta os Estados a “Reduzir substancialmente a corrupção e o suborno em todas as suas formas”;

CONSIDERANDO os princípios e regras que compõem o regime global de prevenção e repressão à corrupção, no marco da Convenção Interamericana contra a Corrupção (OEA, Caracas, 1996), da Convenção sobre o Combate da Corrupção de Funcionários Públicos Estrangeiros em Transações Comerciais Internacionais (OCDE, Paris, 1997) e a Convenção das Nações Unidas contra a Corrupção (ONU, Mérida, 2003);

CONSIDERANDO a existência de iniciativas destinadas a conter ou reduzir os avanços legislativos dos últimos anos, que resultaram na aprovação da Lei de Responsabilidade Fiscal (2000), da Lei da Ficha Limpa (2010) e da Lei Anticorrupção Empresarial (2013);

CONSIDERANDO o papel preponderante da sociedade civil como motor das transformações capazes de produzir desdobramentos positivos no ambiente democrático e consolidá-los;

CONSIDERANDO, por fim, a relevância do trabalho realizado por organizações não-governamentais, a exemplo da Associação Contas Abertas e do Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral - MCCE, para o fortalecimento da cultura anticorrupção e de eficiência da gestão pública no País; e

A partir das preocupações externadas durante os debates e dos riscos identificados no atual arranjo institucional dos Tribunais de Contas do Brasil para o efetivo e eficaz controle da gestão pública e enfrentamento à corrupção, expressa a seguinte Declaração:

1. A independência dos Auditores de Controle Externo do Brasil e a autonomia dos Tribunais de Contas são valores fundamentais para a promoção do Estado de Direito, para a efetividade dos princípios da legalidade e da isonomia e para a efetivação da responsabilidade na esfera de controle externo de qualquer gestor ou responsável pela aplicação de recursos públicos.

2. Os Tribunais de Contas são instituições de auditoria externa autônomas e independentes que congregam - de forma coordenada e harmônica - duas funções essenciais ao exercício do controle externo: a função de auditoria externa, executada pelo Órgão de Instrução, e a função judicante, as quais devem ser realizadas com a estrita observância do princípio da segregação de funções e do devido processo legal.

3. A necessidade de promover a boa gestão pública, prevenir e reprimir a corrupção não dispensa os Auditores de Controle Externo do Brasil - no Órgão de Instrução - e os Membros do Órgão de Julgamento dos Tribunais de Contas do dever de respeitar, rigorosamente, os direitos e garantias dos agentes dos órgãos e entidades jurisdicionados.

4. O processo de controle externo brasileiro deve observar e fazer respeitar as garantias processuais que os artigos 73 e 96, inciso I, alínea ‘a’ da Constituição da República asseguram aos jurisdicionados dos 34 Tribunais de Contas do Brasil, o que pressupõe a realização de auditorias, inspeções e demais procedimentos de fiscalização por agentes legalmente competentes, cuja titularidade das atribuições finalísticas no Órgão de Instrução deve ser privativa dos Auditores de Controle Externo concursados especificamente para tanto, sem prejuízo do auxílio e apoio dos servidores concursados para tal finalidade.

5. A transparência e a visibilidade dos processos de controle externo e da gestão administrativa e financeira dos Tribunais de Contas são essenciais para o controle social da atuação finalística e das unidades administrativas, tendo em vista os princípios constitucionais que regem a Administração Pública e as Leis que asseguram o acesso à informação a todo cidadão.

6. A integração objetivando ações conjuntas com entidades de classe e organizações da sociedade civil constitui objetivo primordial da ANTC para defesa da transparência na gestão e do cumprimento da regra constitucional do concurso público específico, em especial para os cargos cujas atribuições legais congregam atividades exclusivas de Estado.

7. São repudiáveis os atos administrativos e legislativos que afrontem a regra constitucional do concurso público específico e os desvios de função no Órgão de Instrução dos Tribunais de Contas que atentem contra o devido processo legal na esfera de controle externo e a dignidade dos Auditores de Controle Externo do Brasil, assim como quaisquer iniciativas no sentido de alterar a legislação que regulamenta os acordos de leniência para impedir ou reduzir a atuação independente dos Tribunais de Contas do Brasil e do Ministério Público.


Brasília, 10 de novembro de 2016.

Assembleia Geral da ANTC
I CONACON - 2016


Fonte: Comunicação ANTC.

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