DECISÃO DE MORO REFLETE ARGUMENTOS DO MINISTÉRIO PÚBLICO DE CONTAS, MPF, MINISTRO DO TCU E ENTIDADES SOBRE ACORDOS DE LENIÊNCIA

CURITIBA. Na sentença divulgada nesta segunda-feira (20/7), em que determinou as penas de três ex-executivos da Camargo Corrêa condenados na Operação Lava Jato, o Juiz Sérgio Moro, da 13ª Vara Federal em Curitiba, disse nunca ter sido contrário aos acordos de leniência, sendo a questão relevante discutir as condições.

"Para segurança jurídica da empresa, da sociedade e da vítima, os acordos deveriam envolver, em esforço conjunto, as referidas entidades públicas - que têm condições de trabalhar coletivamente, não fazendo sentido em especial a exclusão do Ministério Público, já que, juntamente com a Polícia, é o responsável pelas provas", afirmou Moro em um dos trechos da sentença.

O Juiz enfatiza que os "crimes também afetaram a lisura das licitações, impondo à Petrobrás um prejuízo nos contratos com a Camargo Correa ainda não dimensionado, já que, em tese, com concorrência real, os valores dos contratos poderiam ficar mais próximos à estimativa de preço e não cerca de 18% mais caros".

Na decisão, o Moro também deixa claro que não vislumbrou, a título de indenização mínima, "condições de fixar outro valor além das propinas direcionadas à Diretoria de Abastecimento, isso sem prejuízo de que a Petrobrás ou o MPF persiga indenização adicional na esfera cível".

A sentença é importante para o controle externo porque elucida questão controversa quanto à apuração do dano ao erário, deixando claro que a indenização na esfera criminal restringe-se ao valor das propinas, sem apurar o valor do dano que pode advir de violações à Lei de Licitações, tais como superfaturamento em obras, por exemplo, que podem ser constatados nas auditorias e inspeções realizadas pelo TCU.

A relevância da decisão deve-se ao fato de que o artigo 13 da Lei Anticorrupção prevê procedimento administrativo especial para apurar o dano com a consequente inscrição do valor do débito em dívida ativa, á revelia dos Tribunais de Contas.

Diante disso suscitou-se a dúvida se os acordos de leniência celebrados pela Controladoria-Geral da União, na esfera administrativa, vinculariam outras esferas de responsabilização, já que o artigo prevê inscrição do débito em dívida ativa.

Decisão de Moro reflete entendimento do Ministro Benjamin Zylmer

As dúvidas acerca da responsabilidade pela apuração do dano é um dos pontos mais importantes para os Tribunais de Contas do Brasil, daí a importância da sentença. O tema foi tratado no Seminário sobre Acordos de Leniência promovido pela Procuradoria Regional da República da 3ª Região (PPR3 – SP), no dia 9/6, com apoio da ANTC, AUD-TCU, ANPR, MPD e AMPCON.

Durante sua palestra, o Ministro do TCU, Benjamin Zymler, apontou os pontos críticos da lei criada para punir empresas envolvidas em atos de corrupção contra a administração pública. Zymler avaliou que as empresas denunciadas por atos de corrupção contra a administração pública não têm segurança jurídica para aderir aos acordos de leniência previstos na Lei Anticorrupção.

Há, segundo o Ministro, "choque de atribuições entre o TCU e a Controladoria Geral da União (CGU), ao qual cabe, pela lei, firmar os acordos de leniência com as empresas denunciadas por corrupção", ressalta a matéria publicada no site da PRR3. A exposição do Ministro foi enfática: "De qualquer forma, até em razão da ausência de disposição legal, cabe observar que o eventual ressarcimento do dano efetuado no bojo do acordo de leniência não vincula a atuação do Poder Judiciário e de outras esferas de apuração, como os Tribunais de Contas."

Para Zymler, os poderes da CGU para condução desses acordos "ultrapassam os limites previstos na Constituição". E segue a notícia: "A adesão ao acordo não oferece qualquer segurança jurídica às empresas, pois estas podem ser responsabilizadas em outras instâncias, como pelo Ministério Público Federal (MPF) ou pelo TCU. "É um salto no escuro, com pouquíssimas chances de sucesso", disse.

A decisão do Juiz Sérgio Moro incorpora a essência desse entendimento exposto pelo Ministro do TCU durante evento realizado com apoio da ANTC, AUD-TCU, AMPCON e entidades parceiras, que desde o início do ano fomentam discussões sobre a matéria, ressaltando a necessidade de observar as competências constitucionais dos Tribunais de Contas do Brasil e do Ministério Público com vistas a conferir a segurança jurídica mencionada na sentença.

Em fevereiro deste ano, a ANTC, AUD-TCU, e a Associação Contas Abertas representaram ao Ministério Público de Contas junto ao TCU e expuseram os riscos de celebração de acordos de leniência pela Controladoria-Geral da União com empresas investigadas no âmbito da Operação Lava Jato. Relembre o caso: http://www.antcbrasil.org.br/index.php?secao=noticias&visualizar_noticia=402

A ANTC e a AUD-TCU e AMPCON já promoveram dois importantes debates sobre a matéria com entidades parceiras:

Notícia no site do MPF/PRR3
http://www.prr3.mpf.mp.br/institucional2/1676-seminario-na-prr3-mostra-dificuldades-nos-acordos-de-leniencia

Assista à íntegra da palestra do Ministro Benjamin Zymler no evento do MPF: http://www.tvmpf.mpf.mp.br/videos/896

Confira os principais itens da sentença da Justiça Federal que são importantes para a análise dos processos sobre acordo de leniência

Poder Judiciário
JUSTIÇA FEDERAL
Seção Judiciária do Paraná
13ª Vara Federal de Curitiba

AÇÃO PENAL Nº 5083258-29.2014.4.04.7000/PR

AUTOR: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL

AUTOR: PETRÓLEO BRASILEIRO S/A - PETROBRÁS

"600. Com base no art. 387, IV, do CPP, fixo em R$ 50.035.912,33 o valor mínimo necessário para indenização dos danos decorrentes dos crimes, a serem pagos à Petrobras, o que corresponde ao montante pago em propina à Diretoria de Abastecimento e que, incluído como custo das obras no contrato, foi suportado pela Petrobrás. O valor deverá ser corrigido monetariamente até o pagamento.

601. É certo que os crimes também afetaram a lisura das licitações, impondo à Petrobrás um prejuízo nos contratos com a Camargo Correa ainda não dimensionado, já que, em tese, com concorrência real, os valores dos contratos poderiam ficar mais próximos à estimativa de preço e não cerca de 18% mais caros.

602. Não vislumbro, porém, a título de indenização mínima, condições de fixar outro valor além das propinas direcionadas à Diretoria de Abastecimento, isso sem prejuízo de de que a Petrobrás ou o MPF persiga indenização adicional na esfera cível.

603. Esta condenação pela indenização mínima não se aplica a Alberto Youssef, Paulo Roberto Costa, Dalton dos Santos Avancini e Eduardo Hermelino Leite sujeitos a indenizações específicas previstas nos acordos de colaboração.

604. Do valor fixado para indenização poderão ser abatido os bens confiscados ou as indenizações dos colaboradores, caso não fiquem comprometidos também por confisco em outros processos.

605. Embora a presente sentença não se dirija contra a própria Camargo Correa, tomo a liberdade de algumas considerações que reputo relevantes. Considerando as provas do envolvimento da empresa na prática de crimes, incluindo a confissão de seu ex-Presidente, recomendo à empresa que busque acertar sua situação junto aos órgãos competentes, Ministério Público Federal, CADE, Petrobrás e Controladoria Geral da União. Este Juízo nunca se manifestou contra acordos de leniência e talvez sejam eles a melhor solução para as empresas considerando questões relativas a emprego, economia e renda. A questão relevante é discutir as condições. Para segurança jurídica da empresa, da sociedade e da vítima, os acordos deveriam envolver, em esforço conjunto, as referidas entidades públicas - que têm condições de trabalhar coletivamente, não fazendo sentido em especial a exclusão do Ministério Público, já que, juntamente com a Polícia, é o responsável pelas provas - e deveriam incluir necessariamente, nessa ordem, o afastamento dos executivos envolvidos em atividade criminal (não necessariamente somente os ora condenados), a revelação irrestrita de todos os crimes, de todos os envolvidos e a disponibilização das provas existentes (não necessariamente somente os que foram objeto deste julgado), a adoção de sistemas internos mais rigorosos de compliance e a indenização completa dos prejuízos causados ao Poder Público (não necessariamente somente os que foram objeto deste julgado)."


Fonte: Comunicação ANTC.

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