ANTC E PROCURADOR DE CONTAS DENUNCIAM FALTA DE TRANSPARÊNCIA NO BNDES EM AUDIÊNCIA PÚBLICA NO CONGRESSO NACIONAL

Na última quarta-feira (15/04), a Presidente da ANTC, Lucieni Pereira, participou da audiência pública na Comissão Mista do Congresso Nacional encarregada de emitir parecer sobre a Medida Provisória (MP) nº 663, de 2014, que aumenta o limite de repasse da União ao Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e à Financiadora de Estudos e Projetos (Finep), em operações de financiamento destinadas à aquisição e produção de bens de capital e à inovação tecnológica. A falta de transparência da União na concessão de subsídios foi o ponto mais criticado pelos especialistas e parlamentares.

Confira as apresentações dos expositores e a íntegra das dos discursos.

A exposição de R$ 38 bilhões do BNDES aplicados em ações da Petrobras; a falta de critérios e a concentração de empréstimos do banco em poucas empresas; a troca de títulos do Tesouro Nacional por créditos que rendem bem menos; e a elevada participação de créditos direcionados ao setor público foram mencionadas pelos palestrantes e pelo Senador Ataídes Oliveira (PSDB-TO), relator da MP.


Foto: Jefferson Rudy/Agência Senado

Ataídes apontou distorções no BNDES e questionou o sentido dos empréstimos a entes públicos, visto que o banco deveria ajudar o setor privado sem acesso ao mercado de capitais. Ele também indagou qual seria o impacto das operações do banco nas contas publicas; qual a política que justifica os repasses com o uso do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) e do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT); e quais os riscos que os empréstimos representam para o Tesouro Nacional e a sustentabilidade das contas públicas.

De acordo com a MP nº 663, de 2014, o limite global para as subvenções econômicas de que trata a Lei nº 12.096, de 2009, passa para R$ 452 bilhões. O montante de acréscimo proposto pelo governo, de R$ 50 bilhões, foi estimado a partir de estudos técnicos do BNDES, os quais consideraram a projeção de demanda por financiamentos ate o final do prazo atual de vigência (31.12.2014), assim como as estimativas de demanda por financiamentos de 2015.

A subvenção econômica, sob a modalidade de equalização de taxas de juros, é concedida pela União nas operações de financiamento contratadas ate 31 de dezembro de 2015, no âmbito do Programa de Sustentação do Investimento (PSI), criado em 2009.

MÉTODOS DE GESTÃO

Para a presidente da Associação Nacional dos Auditores de Controle Externo dos Tribunais de Contas do Brasil (ANTC) e Diretora de Assuntos da Área Federal da Confederação Nacional dos Servidores Públicos (CNSP), Lucieni Pereira, a União cada vez mais adota os métodos de gestão na década de 1990, antes da criação da Lei de Responsabilidade Fiscal.

— A União fez esforço na década de noventa para evitar essas práticas em estados e municípios. E hoje ela é praticada pela própria União, que utiliza para atingir a dívida liquida as suas disponibilidades e haveres, usa recursos do FAT na metodologia de cálculo da dívida líquida, sem que esses recursos possam contribuir para a trajetória da divida. Não viemos aqui para dizer se a política pública é boa ou ruim, mas o debate político tem que ser feito com dados — afirmou.

Lucieni disse que a falta de transparência e de informações sobre uma instituição financeira 100% pública, como o BNDES, que possui regras específicas e empresta dinheiro público, representa um risco para o contribuinte.

Em sua exposição, Lucieni evidenciou o saldo dos repasses do Tesouro Nacional para o BNDES, que atingiu R$ 506 bilhões em 2014. A representante também destacou como a distribuição de dividendos do BNDES é usada para cumprimento da meta de resultado primário, além de denunciar a dificuldade que o Tribunal de Contas da União enfrenta para realizar as auditorias solicitadas pelo próprio Congresso Nacional.

— O BNDES atua para inviabilizar as fiscalizações que o TCU faz, para obstaculizar auditoria que está sendo feita neste momento por solicitação da Comissão de Fiscalização da Câmara. Se [os órgãos de controle externo] não podem conhecer essas informações, quem vai ter acesso a esses dados? Se os órgãos que atuam para fiscalizar determinada política subsidiada por dinheiro público são ceifados com instrumentos jurídicos, o que vamos esperar de nossa democracia? — questionou.

Nesse caso, disse Lucieni, recorrer ao principio do sigilo bancário para impedir investigações não se justifica, visto que o BNDES não é um banco privado. Ressaltou, ainda, que sem as informações qualitativas sobre os empréstimos, a análise dos repasses fica comprometida.

— Até que ponto está havendo ajuste fiscal? Ou até que ponto as estatais estão sendo usadas para o governo atingir a meta fiscal? Para investir dinheiro em empresas que são verdadeiras caixas-pretas? O que se estima é que nosso orçamento da saúde terá queda de aproximadamente R$ 7 bilhões, valor significativo quando temos política pública que precisa de aporte de recursos. A transparência está bastante precária em nosso país — afirmou.

— Eu vim aqui pedi o apoio dos Congressistas para que o Congresso Nacional e o TCU consigam fiscalizar os empréstimos realizados pelo BNDES com recursos públicos do Tesouro Nacional. Se o sigilo bancário é usado para obstaculizar essas fiscalizações, então o Congresso Nacional precisa mudar a Lei do Sigilo, pois os recursos do povo não podem ser aplicados à margem do controle público e social", concluiu Lucieni.

Gol da Transparência

A Presidente da ANTC e Diretora da CNSP propôs aos parlamentares que fossem incluídas disposições na Lei de Diretrizes Orçamentárias de 2016 para exigir demonstrativos em prol de maior transparência das despesas decorrentes de subsídios públicos, de forma a permitir o acesso pelos cidadãos aos verdadeiros gastos do orçamento federal.

"Vamos prever, na LDO do próximo ano que acaba de chegar ao Congresso, demonstrativos específicos para evidenciar os subsídios e, assim, emplacarmos um gol da transparência em 2016, já que o atual nível de transparência desse tipo de gasto no Brasil está bastante precário", concluiu Lucieni.

Os parlamentares se comprometeram com a ANTC de incluir as propostas apresentadas pela entidade na LDO-2016, assim como atuar junto ao Supremo Tribunal Federal para garantir o acesso às informações do BNDES durante as fiscalizações realizadas pelo TCU.

DOAÇÕES PROIBIDAS


Foto: Jefferson Rudy/Agência Senado

Para o Procurador do Ministério Publico de Contas junto ao TCU, Júlio Marcelo de Oliveira, as empresas que obtêm empréstimos com juros financiados do BNDES deveriam ser impedidas de fazer doações eleitorais. Ele também denunciou que o Congresso Nacional e o TCU não têm conseguido fazer uma fiscalização efetiva dos financiamentos do BNDES a diversos segmentos, cujo saldo saltou de R$ 10,6 bilhões em 2008 para R$ 506 bilhões em 2014.

— Não temos como avaliar se o banco aplica os recursos bem ou não. O banco é hoje uma caixa-preta na administração pública. O BNDES resiste a todas as tentativas de fiscalização mais profunda do TCU — afirmou.

Júlio Marcelo ressaltou a informação prestada pela Presidente da ANTC de que o BNDES, por meio da Advocacia-Geral da União (AGU), ingressou recentemente com mandado no Supremo Tribunal Federal (STF), que aguarda despacho do Ministro Luiz Fux, pois se nega a oferecer detalhes de empréstimo ao grupo JBS (Friboi).

Ele afirmou que o Tesouro Nacional, "exaurido na sua capacidade de injetar recursos orçamentários no BNDES", tem utilizado a prática ilegal de emissão de títulos do Tesouro diretamente no caixa do banco, em vez de captar recursos no mercado, a partir da emissão dos títulos, para então promover a inversão de capital na instituição.

— Isso cria uma estrutura engenhosa, mas ilegal, com o Tesouro credor do banco e ao mesmo tempo o banco é credor do Tesouro porque dispõe dos títulos. Essas operações não têm passado pela lei orçamentária. [As autoridades] entendem que, fazendo uma inversão desse montante via título não é despesa, e por isso não deveria estar no orçamento. Essa é uma visão errada. O orçamento não se limita apenas a despesas financeiras. Todas essas operações têm que passar pela lei orçamentária, e isso não está ocorrendo — afirmou.

Júlio Marcelo afirmou ainda que a violação da Lei de Responsabilidade Fiscal pelo governo é "frontal e sistemática". Ele entende que o Congresso deve corrigir os rumos e a forma como têm sido aportados recursos no BNDES.

— Acho que a sociedade e o Congresso Nacional gostariam muito de saber essa informação. O BNDES tem a obrigação de dá-la aos órgãos de controle externo — afirmou.

CUSTO DAS OPERAÇÕES



Na avaliação do economista Mansueto Facundo de Almeida Júnior, o que deve ser discutido é o custo das operações do BNDES.

— Quanto ao que o governo deve subsidiar ou não, esse debate é político, e não técnico. O que tem que ficar claro é o custo dessas operações. A Lei de Responsabilidade Fiscal coloca que, para cada um real a mais de despesa, tenho que comprovar a fonte de receita. Nem sempre essa regra acontece para as operações de subsídio. O crescimento da produtividade da economia foi zero nos últimos quatro anos. Não adianta dar crédito subsidiado dessa forma — afirmou.

Mansueto disse que empréstimo do Tesouro para banco público sempre existiu, mas que o "anormal" foi o crescimento nos últimos anos.

— O governo emprestou para bancos no ano passado R$ 445 bilhões, ou 10,65% do PIB [produto interno bruto]. O Brasil e a Índia têm a maior dívida líquida do mundo. Se o Brasil fosse um país rico, nossa dívida bruta ia ser baixa. Mas o que o Brasil paga de juros sobre a dívida pública é mais do que a Grécia [paga] — afirmou.

Mansueto observou que a carga tributaria, hoje em 36% do PIB, vai aumentar, e que por isso o governo tem que discutir a política de pagamento de empréstimos. Ele afirmou que o gasto com programas sociais é crescente desde 1990, mas que o governo tem que deixar claro para a sociedade o custo dos subsídios setoriais "e o que está criando para o futuro".

O Deputado Alfredo Kaefer (PSDB-PR), por sua vez, criticou a engenharia contábil do governo e disse estar "inconformado" com a estratégia adotada em relação ao BNDES. Ele afirmou ainda que as operações externas do banco exigem a atenção da sociedade e do Congresso, visto as obras realizadas com dinheiro da instituição em Cuba e outros países.

— A conta vai aumentar, e há setores que merecem tratamento diferenciado. Mas devemos eleger quem financiar com recursos financiados — afirmou.

Veja a repercussão da audiência pública:

Jornal do Senado - Página 10 (pdf)
Debate aponta falta de transparência no BNDES;

Notícias Rádio Senado e Agência Senado
Comissão debate MP que amplia recursos do BNDES;
Debate aponta falta de transparência no BNDES;

Outras notícias
Audiência Pública MP 663/2014 – aumento do limite do PSI.


Fonte: Comunicação ANTC com informações da Agência Senado.

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