SEMINÁRIO SOBRE LEI ANTICORRUPÇÃO DEBATE IMPACTOS DOS ACORDOS DE LENIÊNCIA PARA OPERAÇÃO LAVA-JATO

Na parte da tarde foram realizados três painéis para discutir aspectos jurídicos dos acordos de leniência. O primeiro painel foi sobre "Acordos de leniência e conflitos de atribuições", o segundo discutiu oportunidades e desafios da Lei Anticorrupção, enquanto o terceiro tratou das práticas de compliance.

O primeiro painel contou com a participação do Procurador do Ministério Pú-blico de Contas junto ao TCU e Vice-Presidente da Associação Nacional do Ministério Público de Contas, Júlio Marcelo de Oliveira, do Diretor da Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe), Alexandre Infante Vieira, do Promotor de Justiça do Estado de São Paulo e Presidente do Movimento do Ministério Público Democrático (MPD), Roberto Livianu, do Secretário-Executivo da CGU, Carlos Higino, além do Senador Ricardo Ferraço, autor do Projeto de Lei do Senado nº 105, de 2015, apresentado para assegurar de forma explícita que os acordos de leniência sejam apreciados pelo Ministério Público.

A primeira questão levantada pelo Procurador de Contas foi acerca da possibilidade da celebração dos acordos de le¬niência pela CGU. Além disso, destacou sua preocupação sobre os critérios de utilização desses acordos. "Acordo de leniência não pode ser usado de forma irrestrita por todas as empresas", disse.

Ferraço, que relatou o Projeto de Lei que deu origem à Lei Anticorrupção, ressaltou que a edição lei teve por finalidade melhorar a eficiência da gestão pública no Brasil, que "foi um dos últimos países a ter esse acordo contra a corrupção ratificado, ficando antes apenas da Argentina".


Foto: Bruno Spada (Secom/TCU)

O Senador também afirmou que o aperfeiçoamento tem o objetivo de deixar a Lei fora da zona de insegurança jurídica para o setor privado. A Lei é objeto de Ação Direta de Inconstitucionalidade no Supremo Tribunal Federal.

Diante das divergências deflagradas, Ferraço se demonstrou convencido da necessidade de aperfeiçoar a Lei Anticorrupção de forma a garantir segurança jurídica às empresas que geram emprego e pagam tributos, mediante a harmonia da atuação dos diversos órgãos de controle de acordo com as competências previstas na Constituição, com vistas a garantir a aplicação uniforme da Lei em toda Federação, tal como foi previsto na Exposição de Motivos do Projeto de Lei em 2009.

A Convenção de Combate à Corrupção de Funcionários Públicos Estrangeiros em Transações Comerciais Internacionais da OECD, que motivou a edição da Lei Anticorrupção para responsabilizar pessoas jurídicas, é resultado do esforço internacional contra a corrupção que teve início com a Foreign Corrupt Practices Act - FCPA, de 1977, Lei Federal norte americana pioneira no combate a atos de corrupção internacional.

O artigo 2º da referida Convenção, porém, dispõe sobre a responsabilidade das pessoas coletivas no sentido de obrigar os "Estados signatários a tomar as medidas necessárias para que, em conformidade com os seus princípios jurídicos, se fixe a responsabilização das pessoas coletivas em caso de corrupção de um agente público estrangeiro".

Amparado nessas premissas internacionais, Roberto Livianu destacou em sua exposição a importância do Ministério Público para a sociedade e defendeu que os acordos de leniência não são mecanismos para salvação de empresas, mas instrumento de combate efetivo à corrupção.

Carlos Higino, por outro lado, afirmou que não há nenhum tipo de operação de salvamento das empresas. "A CGU não fará nenhum tipo de 'acordão', nem operação que vise fazer salvamento das empreiteiras da Lava-Jato. A lei não trouxe essa visão porque não é uma lei de recuperação judicial das empresas", explicou.

Segundo ele, também não haverá aplicação branda das sanções previstas na legislação. O Secretário-Executivo da CGU defendeu que os acordos de leniência não atrapalham as investigações da Lava Jato. "A possibilidade de influências negativas nas sanções é nenhuma", afirmou.

O Procurador de Contas, Júlio Marcelo, porém, contestou essa afirmação. "A possibilidade de celebração de acordos de leniência com a CGU já atrapalhou as investigações da Lava-Jato. Desde a sinalização do órgão de controle interno, as empresas investigadas pararam de fazer delações premiadas, atrapalhando o processo na esfera criminal", ponderou.

O Juiz Federal e Diretor da Ajufe, Alexandre Infante, encerrou o primeiro painel. Em sua exposição, chamou a atenção para possíveis dificuldades de aplicação da nova legislação nos mais de cinco mil municípios brasileiros.


Foto: Bruno Spada (Secom/TCU)

Para Infante, a possibilidade de milhares de órgãos e entidades (secretarias, autarquias, fundações) dos Estados, Distrito Federal e mais de 5,5 mil Municípios celebrarem acordos de leniência com empresas acusadas de envolvimento em fraude à licitação pode trazer insegurança jurídica tanto para o Estado e a sociedade, que têm o interesse de punir as empresas corruptoras, quanto para as empresas, que podem ficar reféns de práticas amadoras ou de má-fé nos mais afastados rincões do país.

Nesse sentido, o Magistrado defendeu não só a importância do Projeto do Senador Ferraço, que prevê a participação do Ministério Público nos acordos de leniência, e foi além: "De lege ferenda, a ciência e a manifestação do MP deveriam ser obrigatórias em todos os processos administrativos de responsabilização da Lei Anticorrupção", argumentou.

Em continuidade à programação, foi realizado painel com objetivo de apresentar desafios e oportunidades da Lei Anticorrupção.


Foto: Bruno Spada (Secom/TCU)

Foram convidados para o painel Nicolao Dino de Castro, Subprocurador-Geral da República e Coordenador da 5ª Câmara de Coordenação e Revisão da Procuradoria-Geral da República, e Marcelo Zenkner, Promotor de Justiça e Secretário de Estado de Controle do Espírito Santo. Lucieni mediou o debate como representante da ANTC e da CNSP.

Durante sua exposição, Nicolao destacou que a improbidade administrativa e a Lei nº 12.846 concorrem na mesma esfera. “Temos que ver a lei dentro de um sistema”, frisou. Segundo ele, uma das maiores oportunidades proporcionadas pela legislação é a integração de todos os setores envolvidos no combate à corrupção. 

Após as exposições de Nicolao e Zenkner, Lucieni ponderou que a intervenção na esfera administrativa encontra limites nos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, cuja ação de controle deve ser necessariamente exercida com adoção de medidas proporcionais à destinação específica da competência do órgão ou entidade.

"Há um limite imposto, especialmente ao legislador, que deve obedecer a certos critérios na elaboração das leis, para que sejam harmônicas com a estrutura constitucional do país, sendo os princípios da proporcionalidade e da segurança jurídica uns dos mais importantes", frisou. "Quando se trata de imposição de restrições a determinados direitos do particular, deve-se indagar não apenas sobre a admissibilidade constitucional da restrição, mas também sobre a compatibilidade das restrições estabelecidas com os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, sem contar a necessária segurança jurídica", completou a representante de classe.

Na visão de Lucieni, os pontos levantados por Nicolao Dino merecem atenção redobrada neste momento em que se pretende, a qualquer custo, conceder benesses a empresas contra as quais pairam evidências robustas apuradas pelo Ministério Público e a Justiça sobre o envolvimento de seus dirigentes em atos que configuram, à luz da Lei nº 8.429, de 1992, improbidade administrativa. "É preciso avaliar bem a pertinência dos acordos de leniência, pois o artigo 17, § 1º, da Lei em questão veda, expressamente, qualquer tipo de transação, acordo ou conciliação nas ações de improbidade administrativa ajuizadas na esfera cível pelo Ministério Público ou pela pessoa jurídica interessada. "Não podemos esquecer que o artigo 30, inciso I da Lei Anticorrupção prevê, de forma taxativa, que suas disposições não afastam a Lei de Improbidade Administrativa",  assinala Lucieni.

O último painel da tarde tratou do tema compliance e contou com a participação do ex-Diretor de compliance da Siemens na América do Sul, Wagner Giovanini, com o Presidente do Instituto Internacional de Estudos de Direito do Estado (IIEDE), Fábio Medina, com o Secretário-Geral da Associação Contas Abertas, Gil Castello Branco, além da Secretária de Transparência e Prevenção da Corrupção da CGU, Patrícia Audi.


Foto: Bruno Spada (Secom/TCU)

O painel buscou enfatizar a importância de as empresas se manterem em situação regular independentemente de estarem em negociação com o governo, evitando assim consequências negativas.

Fábio Medina Osório sinalizou que as empresas, a partir da Lei Anticorrupção, devem adaptar-se aos novos paradigmas de sustentabilidade ética. Nesse contexto, assinalou que não se trata apenas de cultivar códigos de ética e de conduta, ou de ministrar cursos de treinamento aos empregados, mas sim de criar condições internas para apurar e punir ilícitos dentro das organizações privadas.

Giovanini falou sobre sua experiência na Siemens e enfatizou que o compliance não pode ser apenas um mecanismo de blindagem da empresa, mas sim de efetivo vínculo com padrões éticos.

Já o Economista Gil Castello Branco teceu duras críticas ao Governo Federal, sustentando a importância da manutenção de controles da sociedade civil organizada.


Fonte: Comunicação ANTC com informações do União/TCU, AJUFE, Contas Abertas e IIEDE.

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