BRASÍLIA. Na tarde desta quinta-feira (26/2), a Presidente da ANTC, Lucieni Pereira, participou do debate promovido pela Associação da Auditoria de Controle Externo do Tribunal de Contas da União (AUD-TCU) para discutir os possíveis impactos do acordo de leniência sobre as ações no âmbito da 'Operação Lavajato'.
O evento ocorreu no auditório do Prédio Sede do TCU e teve por objetivo promover o debate entre os Auditores de Controle Externo e oferecer contribuições para o aperfeiçoamento e regulamentação da Instrução Normativa TCU nº 74, de 2015, que dispõe sobre o encaminhamento dos acordos de leniência celebrados pela Controladoria-Geral da União (CGU).
O debate foi aberto pelo Presidente da AUD-TCU, Marcelo Amaral, seguido pelo Secretário-Geral da Presidência do TCU, Eduardo Monteiro de Rezende, pelo Coordenador-Geral de Controle Externo da Área de Infraestrutura e da Região Sudeste, Arsênio José da Costa Dantas, pelo Secretário-Geral da Associação Contas Abertas, Gil Castello Branco, e pelo Primeiro Vice-Presidente da AUD-TCU, Carlos Augusto Ferraz.
Eduardo expôs que as iniciativas do TCU desde fevereiro de 2014, quando entrou em vigor a 'Lei Anticorrupção', destacando a criação do Grupo de estudo, coordenado pelo Ministro Benjamin Zymler, do qual participaram Auditores do TCU designados pela Segepres, pelo Órgão de Instrução (Segecex) e Assessores dos Gabinetes, além do Ministro Substituto Weder de Oliveira.
"O TCU vai fiscalizar, não vai participar do acordo", frisou Eduardo.
Arsênio chamou atenção para a necessidade de que todas as unidades do Órgão de Instrução do TCU se inteirarem do tema, pois os acordos de leniência não ocorrerão apenas na área de infraestrutura, sendo as fraudes em licitação uma realidade presente em diversas políticas públicas.
Lucieni fez uma contextualização sobre a iniciativa das entidades em representar ao Ministério Público de Contas. Destacou que as entidades não são contra a IN do TCU. Depois, ressaltou as falácias do Advogado-Geral da União (AGU), Luís Inácio Adams, sobre os fundamentos da Representação.
A representante destacou que a iniciativa das entidades não está fundada na repercussão penal sob o ponto de vista objetivo, mas dos reflexos do acordo de leniência na aplicação das sanções na esfera cível, uma vez que sua celebração afasta a competência do Juiz para aplicar as penalidades de multa e proibir empresas receber benefícios fiscais e creditícios nas ações civis públicas fundamentadas na 'Lei Anticorrupção'.
Lucieni também ressaltou que o artigo 88 da Lei nº 8.666, de 1993, insere na competência administrativa do Ministro de Estado ou Secretário Estadual e Municipal a declaração de inidoneidade, por até dois anos, de empresas que tenham praticado atos ilícitos visando frustrar os objetivos da licitação (inciso II) ou demonstrem não possuir idoneidade para contratar com a Administração em virtude de atos ilícitos praticados (inciso III).
Essa sanção de natuza administrativa, porém, não afasta a competência do TCU prevista no artigo 46 da sua Lei Orgânica e a competência do Poder Judiciário fixada no artigo 12 da Lei de Improbidade Administrativa (Lei nº 8.429, de 1992) para declararem empresas inidôneas nas esferas de controle externo e cível, respectivamente.
Igualmente preocupa o disposto no artigo 13 da 'Lei Anticorrupção', ao prever a instauração de processo administrativo específico para apurar a reparação do dano. Para Lucieni, esse processo específico deve ser a tomada de contas especial, cabendo ao TCU julgar as contas e fixar o débito por força do artigo 71, inciso II da Constituição.
Outro ponto que preocupa os Auditores e Procuradores é a previsão de que, não havendo pagamento, o crédito apurado pelo órgão de controle interno federal e pelos próprios gestores dos demais Poderes da União, assim como dos Estados e Municípios, possa ser inscrito em dívida ativa da Fazenda Pública (parágrafo único), sem considerar a competência privativa dos Tribunais de Contas.
"A previsão de inscrição do valor do dano na dívida ativa é uma tentativa capenga inserida na Lei para esvaziar a competência da Corte de Contas, uma vez que o artigo 71, § 3º da Constituição confere às decisões do TCU - e apenas do TCU - eficácia de título executivo, por isso deve-se questionar a constitucionalidade do dispositivo", adverte Lucieni.
"Esqueceram que a função constitucional dos órgãos de controle interno é apoiar o controle externo na sua missão institucional, sem que tenha sido conferido àqueles poderes sancionador e decisório que permitam fixar definitivamente o valor do débito e executar a decisão no plano administrativo, à revelia do controle externo", complementa a representante de classe.
Carlos Ferraz expôs os principais pontos da IN do TCU, destacando a necessidade de rever a previsão do artigo 3º, o qual dispõe que a apreciação pelo TCU sobre as etapas que compõem a celebração dos acordos de leniência constituirá condição necessária para a eficácia dos atos subsequentes.
PROCURADOR DE CONTAS PRESTIGIA O EVENTO
O Procurador de Contas, Júlio Marcelo de Oliveira, que acolheu a Representação das entidades e representou ao TCU, também esteve presente e expôs os riscos da Lei nº 12.846, de 2013, também conhecida como 'Lei Anticorrupção'.
Foto: AUD-TCU
Júlio Marcelo falou que é desprovido de razoabilidade a CGU celebrar acordo de leniência no curso das investigações no âmbito do Ministério Público Federal e Polícia Federal, muitas delas sob sigilo.
"A CGU não tem como avaliar se as revelações das empresas perante o órgão poderão ou não ampliar o escopo das investigações, uma vez que não dispõe de todas as informações sob sigilo nas investigações cíveis e criminais", destacou o Procurador.
"O acordo de leniência é um instituto jurídico para as empresas colaborarem com a ampliação das investigações", ponderou Júlio Marcelo. "A Lei Anticorrupção não institui um 'programa de salvamento' de empresas que fraudam o Estado, pois se assim fosse a Lei não poderia conferir tratamento diferenciado entre empresas, com benefício apenas para a primeira que colaborar com os órgãos de investigação", concluiu o Procurador de Contas.
Para Lucieni, o acordo de leniência poderá ser considerado nulo se não atender aos pressupostos da Lei e os princípios fundamentais do Direito. "Tanto a Justiça quanto o TCU podem declarar a nulidade do acordo celebrado pela CGU sem observar esses pressupostos", alertou a Presidente da ANTC.
PARTICIPAÇÃO DOS AUDITORES NO DEBATE
Após as exposições, os Auditores participaram com perguntas e ponderações. Uma das dúvidas foi quanto à instauração ou não de tomada de contas especial para cada acordo de leniência, assim como sobre qual rito será adotado.
Também foi destacada a necessidade de refletir sobre os prazos a serem adotados, pois a quantificação do dano ao erário não é matéria trivial, sendo em geral alvo de controvérsias que não são fáceis de resolver.
Uma das ponderações foi o fato de que o artigo 16, § 3º da 'Lei Anticorrupção' prevê expressamente que o acordo de leniência não exime a pessoa jurídica da obrigação de reparar integralmente o dano causado.
Foto: AUD-TCU
A Segunda Vice-Presidente da AUD-TCU, Glória Merola, e o Vice-Presidente da ANTC para Assuntos do TCU, Diógenes Vieira, também estiveram presentes e destacaram a importância da participação dos Auditores nesse debate.
Fonte: Comunicação ANTC.