BRASÍLIA: A Revista Carta Capital desta semana traz reportagem sobre o Tribunal de Contas da União que merece especial atenção da classe auditores de controle externo.
Intitulada "Canhões a postos": "O Tribunal de Contas da União aumenta as críticas ao governo federal, que reclama do viés político da instituição", a matéria tenta passar a ideia de que as fiscalizações são pivô de uma crise institucional entre o TCU e o Governo Federal.
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A reportagem destaca trechos da entrevista da presidente da ANTC, Lucieni Pereira, que respondeu, por escrito, as seguintes perguntas formuladas pelo jornalista autor da matéria:
1 - Como o corpo técnico do TCU vê o atual estado de tensão entre a corte e o governo? Creio que esta tensão ficou nítida com a inédita sustentação oral feita pelo AGU em uma sessão plenária do Tribunal e, também, com a controvérsia pública entre o Tribunal e o Ministério do Desenvolvimento Social tendo por objeto um relatório de análise sistêmica;
2- Como o corpo técnico do TCU avalia o posicionamento do governo perante o trabalho cotidiano da corte? Estaria dentro ou fora dos limites adequados? Por quê?
3 - Do ponto de vista do corpo técnico do TCU, o atual formato de composição da corte causa algum tipo de prejuízo ao trabalho dos Auditores? Por quê?
Imagens: Carta Capital, Edição 1º de outubro de 2014 e CNSP
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Ministra do MDS estaria "aborrecida com o que considera machismo"
Ao relatar a visita da ministra do Desenvolvimento Social ao TCU e as manifestações dos ministros durante a sessão plenária em defesa dos auditores, a Carta Capital registra que a ministra do MDS estaria "aborrecida com o que considera machismo e não será surpresa se tomar providências após as eleições".
A razão para o suposto aborrecimento seria o uso do termo 'faniquito' pelo Jornal Folha de São Paulo, de 17 de setembro, para relatar o comportamento da ministra do MDS durante visita ao TCU. Relembre a manchete: "Ministra dá 'faniquito' no TCU e ministros fazem nota de repúdio".
Na ocasião, a ANTC rebateu o teor ofensivo da Nota Oficial do MDS com números que comprovam o caráter falacioso do documento sobre a desatualização dos indicadores do Programa Bolsa-Família.
A ANTC informou que, de acordo com o Decreto nº 6.917, de 30/07/2009, o parâmetro considerado para a linha de extrema pobreza, fixado em R$ 70,00, equivalia a US$ 1,2404 ao dia considerado o dólar oficial do Bacen (US$ 1,8811). O Decreto nº 7.492, de 2/6/2011, citado na Nota, mantém o valor em R$ 70,00 por mês, que equivale US$ 1,4763 dia.
Apenas com a edição do Decreto nº 8.232, de 30/4/2014, o parâmetro adotado para linha de extrema pobreza foi reajustado, passando de R$ 70,00 para R$ 77,00 ou US$ 1,1478 dia, já que a taxa do dólar na data do Decreto era de US$ 2,2360 de acordo com o Bacen. Portanto, o valor adotado pelo Governo Federal em 2014 não observa, sequer, o parâmetro internacional de US$ 1,25 dia.
A ANTC também destacou que, no período de 30/07/2009 a 30/04/2014, a inflação acumulada (IPCA-Geral) foi de 32,27%, enquanto o reajuste do indicador, em reais, foi de tão somente 10%. Quando se faz essa mesma comparação em dólar, nota-se, porém, queda de 7,46% no período ou de US$ 0,0926 dia.
Essa falta de atualização do parâmetro faz parecer que o número de famílias abaixo da linha de extrema pobreza é menor do que seria se os valores fossem reajustados, constituindo uma espécie de 'pedalada social' para mascarar os números divulgados para sociedade. Essa é a razão da polêmica em torno do FiscAssistência.
A ANTC aguardará as supostas "providências" da ministra do MDS contra o Jornal Folha de São Paulo, que adotou o termo 'faniquito' na manchete jornalística para qualificar a conduta da ministra em visita institucional ao TCU.
Crítica aos auditores do TCU
Com destaques do tipo "tribunal também emperra a Lei dos Portos e alimentou a crise da Petrobrás", o jornalista autor da matéria adota tom crítico em relação ao TCU e aos auditores, merecendo leitura as seguintes passagens: "Agora, o tribunal parece viver o auge de sua afirmação pós-ditadura. Seus auditores sentem-se 'empoderados', estão organizados e às vezes arriscam-se a críticas que extrapolam o exame das contas para opinar sobre políticas públicas".
Ressalta, ainda, que os auditores possuem "agenda própria, motivo de tensões internas no tribunal". E conclui suas críticas: "Órgão auxiliar do Legislativo, o TCU tem muitos ministros políticos, ex-parlamentares. Em uma Corte comum, o juiz é o senhor de seu gabinete, pela autoridade de magistrado. No TCU, é quase um refém dos auditores".
RESPOSTA DA ANTC ÀS CRÍTICAS DA
REVISTA CARTA CAPITAL
Auditores empoderados
O empoderamento dos auditores do TCU decorre, primeiro, do ingresso no cargo por meio de concurso público específico, o que os legitima para o exercício das atividades finalísticas de controle externo previstas nos artigos 70 e 71 da Constituição de 1988; segundo, provém do conhecimento técnico multidisciplinar e profundo que a classe detém sobre temas diversos referentes à gestão pública.
Em qualquer sociedade alicerçada no Estado de Direito, não há espaço para sentimentos exacerbados de poder. Ou o agente público dispõe de competência institucional para o exercício da função ou então os atos praticados devem ser desconstituídos pela via processual, seja no âmbito do próprio TCU, seja, em última instância, no Poder Judiciário. Assim, a acusação de que auditores do TCU 'sentem-se empoderados' é desprovida de conteúdo.
É a Constituição de 1988 que insere na competência do TCU a realização de auditoria de natureza operacional, a ser exercida pelos auditores de controle externo com exclusividade. Cumpre esclarecer que essa fiscalização visa municiar o Congresso Nacional com análise técnica e apartidária para o exercício da avaliação dos planos de governo tal como previsto no artigo 49, inciso IX da Carta Política.
Terceiro aspecto que precisa ser considerado é que o empoderamento dos auditores também é resultado da organização da classe em torno de uma Associação Nacional (ANTC) e da atuação junto à sociedade civil, que legitima suas ações e propostas que vão além de interesses corporativos da classe, sendo muito mais voltadas para a melhoria da gestão pública, da cidadania e em defesa do controle externo e social.
Empoderamento institucional e associativo dos auditores
O empoderamento dos auditores de controle externo é reconhecido nacional e internacionalmente. No plano institucional, foi confiado ao TCU a Presidência do Subcomitê de Auditoria de Desempenho da Organização Internacional de Entidades Fiscalizadoras Superiores (Intosai), que visa traçar padrões internacionais para o "exame independente e objetivo da economicidade, eficiência, eficácia e efetividade de organizações, programas e atividades governamentais, com a finalidade de promover o aperfeiçoamento da gestão pública".
A Intosai é organização autônoma, independente e apolítica fundada em 1953 com status consultivo especial no Conselho Econômico e Social das Nações Unidas (ECOSOC/ONU), e que atualmente congrega 192 Países - com destaque para a participação das maiores democracias do mundo -, além de 5 membros autônomos.
Esse reconhecimento comprova que os auditores do TCU não se arriscam - e às vezes - "a críticas que extrapolam o exame das contas para opinar sobre políticas públicas". As fiscalizações para avaliar o desempenho dos programas de governo são permanentes, integram o planejamento estratégico do TCU e fazem parte do plano de fiscalização aprovado pelos ministros em sessão plenária.
São fiscalizações embasadas em conhecimento técnico e jurídico sobre as políticas públicas, realizadas por auditores experientes e que conhecem de modo profundo o assunto. Nesse tipo de trabalho, não há espaço para escolhas pessoais, tampouco manifestação de opiniões a esmo. Fosse assim, não seria o TCU referência internacional, à frente de discussões desse tema na Intosai.
O empoderamento se dá também no âmbito associativo. Recentemente, foi confiada à classe dos auditores de controle externo do Brasil a condução da Diretoria de Assuntos da Área Federal da Confederação Nacional dos Servidores Públicos (CNSP), entidade que congrega associações representativas de mais de 800 mil servidores das esferas federal, estadual e municipal. Durante o biênio 2015-2016, a ANTC atuará nas instâncias de Poder em defesa dos interesses dos servidores representados pela Confederação.
Ministro é 'refém' dos auditores do TCU ou respeita segregação de funções?
Em sua reportagem, o jornalista expressa opinião crítica no sentido de que, no TCU, o ministro "é quase um refém dos auditores". A ANTC, todavia, discorda dessa crítica.
Na condição de líder mundial para definir padrões de fiscalização sobre programas e atividades governamentais, os ministros do TCU não poderiam adotar outra postura senão respeitar o princípio que impõe a segregação de duas funções precípuas dos Tribunais de Contas: a primeira é a função de auditoria, realizada exclusivamente pelos auditores de controle externo concursados especificamente para essa finalidade; a segunda é a função de julgamento, a cargo dos magistrados de contas.
Ambas funções exclusivas de Estado são exercidas com independência no TCU, de forma a materializar o Estado Democrático de Direito tal como delineado na Constituição de 1988 e a observar, de fato, os padrões nacionais e internacionais de auditoria.
Se procedesse diferentemente, o TCU seria visto pela Intosai como 'casa de ferreiro espeto de pau', o que, certamente, lhe deslegitimaria para o exercício da presidência do Subcomitê mencionado.
A ANTC respeita a liberdade de qualquer cidadão para criticar as instituições e os agentes públicos, e não estará à altura da missão o agente de Estado que não suporta críticas. Mas também tem o compromisso de bem informar o leitor.
Proposta da ANTC não incorpora visão maniqueísta 'ministros concursados' versus 'ministros políticos' para composição do TCU
Tramitam no Congresso Nacional pelo menos 4 propostas de emenda constitucional (PECs) que exigem concurso público para preenchimento das 9 vagas de ministro do TCU.
Ao citar outra entidade, a reportagem registra que a "legislação atual, com cotas para indicações feitas pelo presidente da República, o Senado Federal e a Câmara dos Deputados, seria 'retrógrada'", ressaltando, ainda, que o "correto seria indicar só auditores".
Para discutir as PECs mencionadas, a ANTC não leva ao Congresso Nacional entendimento unilateral da Diretoria, mas a percepção da classe de auditores de controle externo apurada, inclusive, por meio de enquete eletrônica.
E a classe de auditores do TCU não expressa a crença de que a solução para os desafios dos Tribunais de Contas possa resultar da visão maniqueísta que polariza 'ministros concursados' versus 'ministros políticos' para a composição do TCU, tampouco se percebe apoio a propostas de concurso público ou indicação exclusiva de auditores para as 6 vagas da cota do Congresso Nacional.
Para além do controle da legalidade dos atos, a ANTC considera que os magistrados de contas despontam como atores capazes de afetar, substancialmente, a trajetória da ação governamental, sendo necessário compreender que as instituições com poder de julgamento e as preferências dos julgadores constituem, de forma articulada, fatores determinantes na aplicação de políticas públicas.
PEC do Padrão Mínimo da ANTC assegura caráter heterogêneo na composição do TCU
Para discutir as PECs que propõem concurso público para os cargos de ministro, ANTC apresenta proposta alternativa que assegura composição heterogênea para o TCU. Tal proposta garante representação dos principais atores do processo de contas no colegiado.
O grupo dos concursados passa a ser composto por 5 membros provenientes das carreiras de ministros-substitutos, procuradores de Contas, auditores de controle externo e advogados públicos da AGU. No grupo de livre escolha do Congresso Nacional, permanecem 4 vagas para indicação da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, conforme diagrama a seguir:
Com essa proposta, que assegura a indicação de 2 auditores (1/3 da cota do Congresso Nacional) sem afastar a participação de parlamentares (no total de 4 vagas ou 2/3 da cota do Congresso Nacional), a ANTC faz um debate responsável que pondera a importância de garantir heterogeneidade e pluralidade na composição do TCU, cuja atuação pressupõe enfrentamentos políticos e econômicos de grandes proporções que fazem desses pressupostos elementos essenciais para o equilíbrio das decisões da mais Alta Corte de Contas do País.
A ANTC também acredita que o avanço almejado pela sociedade decorrerá, sem sombra de dúvida, da aprovação de normas nacionais que padronizem a exigência dos requisitos de idoneidade moral, reputação ilibada, comprovação da qualificação técnica e, acima de tudo, de outras condicionantes que previnam conflito de interesse que tenham o potencial de abalar a credibilidade das decisões decorrentes do exercício da magistratura de contas.
A verificação rigorosa dessas condicionantes, porém, deve ser feita tanto dos candidatos que não são de carreira quanto daqueles integrantes das carreiras propostas para a nova composição.
"Esse é um debate que deve ser conduzido sem corporativismos e maniqueísmos, mas com espírito público visando ao efetivo aperfeiçoamento da instituição que tem a missão hercúlea de maximizar o retorno que o Estado deve aos cidadãos-contribuintes", finaliza Lucieni.
Fonte: Comunicação ANTC.