ONG Contas Abertas chegou a pedir ao ministro corregedor do TCU que destaque a PF e o Ministério da Justiça para apurar o caso
(Atualizado às 16 horas)
Entidades fiscalizadoras dos gastos públicos reagiram nesta quarta-feira com preocupação à revelação, por VEJA, da intensa troca de favores entre o ministro do Tribunal de Contas da União (TCU), Walton Alencar, e a então ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, e seu braço-direito na pasta, Erenice Guerra. Mensagens trocadas entre as autoridades revelaram que o ministro passava informações do tribunal ao governo federal. Como recompensa pelas informações privilegiadas, ele conseguiu nomear a mulher e o irmão para cargos de ponta no Superior Tribunal de Justiça (STJ) e no Tribunal Superior do Trabalho (TST).
A ONG Contas Abertas enviou uma representação ao ministro corregedor do Tribunal de Contas da União, Aroldo Cedraz, para que apure a "veracidade do conteúdo das notícias junto à Polícia Federal e o Ministério da Justiça" e tome "as medidas cabíveis previstas na legislação". Assinado pelo secretário-geral da entidade, Francisco Gil Castello Branco, o texto ressalta o papel do TCU de "fiscalizar a administração pública federal", e afirma que as decisões do tribunal podem afetar "consideravelmente a implementação das políticas públicas", o que acentua a "gravidade das denúncias".
A Associação Nacional dos Auditores de Controle Externo dos Tribunais de Contas do Brasil (ANTC) citou a Lei Orgânica e o Código de Ética da Magistratura para argumentar que os ministros devem atuar de forma "imparcial, prudente e cautelosa". Além desses atributos, a nota reforça que os ministros, procuradores e auditores do TCU, na função de "fiscais da contabilidade" do governo, devem ser "isentos, impessoais e apartidários". "A ANTC confia que as intituições republicanas competentes se empenharão para apurar os fatos a partir da veracidade das informações divulgadas, pois a veiculação de notícias com esse teor provoca abolo substancial na credibilidade e compromete a acreditação social nas decisões da mais alta corte de contas do país", publicou a nota.
Já a Associação Nacional do Ministério Público de Contas (Ampcon) defendeu que as "graves notícias recentemente publicadas pela revista VEJA e pelo jornal O Globo" devem ser "exaustivamente esclarecidas mediante os adequados procedimentos a serem adotados pelas instâncias e autoridades competentes". "Sem nenhum prejulgamento das circunstâncias e personalidades mencionadas pelos referidos órgãos de comunicação, o completo esclarecimento dos fatos noticiados é medida que se impõe para que não pairem dúvidas sobre a isenção dos julgamentos proferidos pelo Tribunal de Contas da União", informou a entidade, que representa os membros do Ministério Público de Contas junto aos 34 Tribunais de Contas do país.
O Tribunal de Contas da União (TCU) carrega entre suas prerrogativas constitucionais a missão sagrada de zelar pelas melhores práticas de gestão na máquina estatal. É ponto pacífico, nesse caso, que quem tem o poder de fiscalizar e punir o erro alheio, tem também a obrigação de dar exemplo de correção no funcionalismo. A capacidade de ser transparente e de não se omitir ante os problemas que possam aparecer é o que faz do tribunal uma instituição forte, capaz de depurar seus procedimentos, ou uma instituição frágil, submetida a interesses fisiológicos e antirrepublicanos. Na mais recente edição de VEJA, que está nas bancas, o tribunal é confrontado com esses dois caminhos: a responsabilidade ou a omissão.
Quatro dias depois de ter tomado conhecimento das mensagens nas quais Walton repassa informações privilegiadas do TCU à Casa Civil na mesma velocidade em que usa a influência de Dilma e Erenice para conseguir a nomeação de sua mulher, Isabel Gallotti, para o Superior Tribunal de Justiça (STJ), o presidente do tribunal, ministro Augusto Nardes, emitiu um único pronunciamento em que afirma que "tomou ciência das notícias veiculadas no último final de semana e irá emitir pronunciamento após avaliação". Procurado para se posicionar sobre o caso, o corregedor do tribunal, ministro Aroldo Cedraz, a quem compete investigar desvios de conduta como os ora revelados por VEJA, também silenciou.
O único que se manifestou sobre o caso, por mais irônico que isso possa parecer, foi o próprio ministro Walton Alencar. A nota enviada por ele ao comando do TCU merece ser lida mais pelo que o ministro omite do que pelo que diz. Ignorando as mensagens reproduzidas em VEJA em que ele escreve a Erenice em diferentes momentos para trocar favores e pedir ajuda para emplacar a sua mulher num cargo de ponta, Walton concentra-se sobre o mais leve dos pecados revelados na reportagem: a parte que Erenice solicita que ele aconselhe o advogado do PT Márcio Silva sobre questões eleitorais: "Na qualidade de ministro do TCU, tenho, por dever de ofício, de manter contato com autoridades de todos os Poderes e escalões. Nesse sentido, a solicitação da então ministra Chefe da Casa Civil de receber certo advogado nada significa, pois todos sabem que todos os advogados que solicitam audiência no meu gabinete são por mim recebidos indiscriminadamente". Receber um advogado é uma coisa. Dar conselhos eleitorais a ele, outra bem diferente. A resposta seletiva do ministro joga ainda mais responsabilidade sobre o comando do TCU, a quem cabe adotar as devidas providências sobre o caso.
Confira a nota da Ampcon na íntegra:
A Associação Nacional do Ministério Público de Contas, Ampcon, entidade de âmbito nacional que representa os membros do Ministério Público de Contas junto aos 34 Tribunais de Contas do Brasil, manifesta sua preocupação com as graves notícias recentemente publicadas pela revista Veja e pelo jornal O Globo a respeito do Tribunal de Contas da União.
A bem da credibilidade da mais alta corte de contas do país e da confiança que nela deposita toda a sociedade brasileira, a AMPCON espera e confia que os fatos narrados sejam exaustivamente esclarecidos mediante os adequados procedimentos a serem adotados pelas instâncias e autoridades competentes, nomeadamente a Presidência do Tribunal de Contas da União, a teor do artigo 50 de seu Regimento Interno, e sua Corregedoria, bem como o Procurador-Geral da República.
Sem nenhum prejulgamento das circunstâncias e personalidades mencionadas pelos referidos órgãos de comunicação, o completo esclarecimento dos fatos noticiados é medida que se impõe para que não pairem dúvidas sobre a isenção dos julgamentos proferidos pelo Tribunal de Contas da União.
Fonte: veja.com.