NOTA PÚBLICA ANTC & CNSP

A Associação Nacional dos Auditores de Controle Externo dos Tribunais de Contas do Brasil (ANTC) e a Confederação Nacional dos Servidores Públicos (CNSP), entidade que congrega associações representativas de mais de 800 mil servidores, a propósito do teor da Nota Oficial do Ministério de Desenvolvimento Social (MDS), em que ataca a fiscalização realizada pelo Tribunal de Contas da União nos programas sociais do Governo Federal, vêm a público manifestar-se nos seguintes termos:

1. O trabalho de fiscalização sob ataque ('FISCASSISTÊNCIA') faz parte de estratégia adotada pelo TCU de consolidação de diversos trabalhos sobre políticas públicas setoriais, com a finalidade de prestar auxílio ao Congresso Nacional e contribuir para o aperfeiçoamento da Administração Pública em benefício da sociedade;

2. Nessa linha, o TCU já apreciou o FISCSAÚDE, cujo resultado a ANTC expôs recentemente durante as audiências públicas realizadas pelo Supremo Tribunal Federal (STF) sobre 'diferença de classe no SUS' e Ministério Público Federal em São Paulo (MPF/SP) sobre 'subfinanciamento da saúde'. Outro importante trabalho é o FISCEDUCAÇÃO, que antecipa desafios confirmados por avaliações oficiais realizadas pelo Poder Executivo;

3. Parte do FISCASSISTÊNCIA sob ataque tratou da linha de acessibilidade aos programas sociais implementados do Governo Federal, dentre os quais está inserido o Programa Bolsa Família. Irresignado com o resultado da fiscalização setorial, o MDS publicou Nota por meio da qual afirma que o "texto revela ignorância dos técnicos" [Auditores do TCU] "sobre os critérios internacionais de mensuração de pobreza, desconhecimento da legislação e até mesmo erros de cronologia que induziram os Ministros a equívoco";

4. Sobre essa acusação destemperada, a ANTC e a CNSP repudiam a forma grosseira e deselegante com que o Ministério se refere, oficialmente, aos Auditores e ao próprio TCU, seja pela falta de urbanidade, seja pelo pouco apreço pela divergência, que materializam a noção de Estado de Direito;

5. Cumpre registrar que os trabalhos realizados pelo TCU na área de avaliação de políticas públicas são reconhecidos pela academia, por diversos órgãos do Poder Executivo e, sobretudo, pela comunidade internacional representada pelos organismos que congregam as Entidades de Fiscalização Superior (INTOSAI e OLACEFS);

6. A Nota do MDS alega, ainda, que o "documento produzido pelo TCU desconsiderou as respostas e esclarecimentos técnicos prestados pelo MDS". Trata-se, porém, de acusação improcedente, já que o Relatório Preliminar do FISCASSISTÊNCIA foi submetido à apreciação do MDS durante 30 dias, sendo que todos os comentários formulados pelo gestor foram detidamente analisados e incorporados ao Relatório Final, como é de praxe em quaisquer fiscalizações realizadas pelo TCU;

7. Isso não significa, porém, que a equipe de auditoria seja obrigada a concordar com todas as alegações apresentadas pelo gestor. A independência dos Auditores é uma das prerrogativas inerentes ao controle externo em países democráticos, cujos agentes não podem se intimidar com a mera contrariedade e o 'jus sperniandi' de jurisdicionados;

8. A Nota do MDS também cita que o "texto conclui que os dados de extrema pobreza podem estar distorcidos em virtude da não atualização da linha de extrema pobreza desde 2009. A linha somente foi instituída por decreto presidencial nº 7.492, em 2 de junho de 2011. Não há, portanto, como se falar em correção desde 2009". Essa, todavia, é argumentação falaciosa que visa jogar a opinião pública contra o TCU, pois a linha de pobreza é utilizada pelo Governo Federal como critério de acesso ao Programa Bolsa Família desde sua criação, com detalhamento explícito do critério no Decreto nº 6.917, de 2009, que altera o artigo 18 do Decreto nº 5.209, de 2004;

9. Impende frisar que os Planos Plurianuais (PPA) 2008-2011 e 2012-2015 estabelecem indicador social referente à 'taxa de atendimento às famílias pobres', um dos parâmetros da fiscalização. Já o Relatório de Gestão do MDS 2011 traz o indicador 'percentual de famílias pobres atendidas que ultrapassaram a linha de pobreza' com resultados para os exercícios 2009 e 2010. Resta claro, pois, que a linha de pobreza é, sem dúvida alguma, parâmetro oficial e essencial para o acompanhamento de políticas públicas de redução da pobreza;

10. Quanto ao parâmetro internacional de US$ 1,25 por dia (ou R$ 77,00 por mês), os Auditores não ignoram. Pelo contrário, apontam - para fins de acompanhamento científico - que os valores praticados em 2014 não refletem o parâmetro internacional, cujo patamar mensal atualizado equivale a cerca de R$ 86,00;

11. É de se anotar que o FISCASSISTÊNCIA, em passagem alguma, sinaliza para a necessidade de aumento do benefício com possíveis impactos fiscais. A avaliação limita-se a chamar atenção para possíveis distorções que a não-atualização dos valores pode acarretar para acompanhamento do efeito da política sobre pobreza no país;

12. Portanto, se há desconhecimento sobre os critérios internacionais de mensuração de pobreza, sobre a legislação e erros de cronologia como afirma a Nota do MDS, tais deficiências não são dos Auditores do TCU, cuja qualidade de trabalhos dessa natureza é reconhecida internacionalmente;

13. Quanto às acusações de caráter partidário, cabe informar à sociedade que o Relatório Final do FISCASSISTÊNCIA - apreciado pelo Plenário do TCU e que será divulgado para a sociedade - não traz nenhuma citação de projetos que tramitam no Congresso Nacional apresentados por quaisquer partidos;

14. As propostas legislativas sobre matéria social mencionadas no Relatório Preliminar foram retiradas em atendimento a ponderações/comentários apresentados pelo próprio gestor do MDS. Assim, resta comprovado o compromisso do TCU com a imparcialidade e a observância dos padrões nacionais e internacionais de auditoria;

15. Antes de finalizar, merece anotação que as auditorias realizadas pelos Auditores integram o plano de fiscalização aprovado previamente pelos Ministros do TCU, sem espaço para a realização de trabalhos por motivações pessoais e/ou partidárias de qualquer Auditor. Assim sendo, ao fazer ilações sobre "posicionamento político expresso no relatório do TCU às vésperas das eleições presidenciais", o Governo atinge a cúpula do TCU, a quem compete não apenas aprovar o plano de fiscalização, mas decidir sobre o mérito das auditorias e avaliar a oportunidade de seu julgamento pelo colegiado;

16. É lamentável que o Governo Federal declare publicamente que os Ministros do TCU foram induzidos a equívoco em decorrência da 'ignorância dos técnicos' (Auditores), o que, se fosse verdade, poria em xeque as reais credenciais daqueles para a função de judicatura na esfera de controle externo.

Diante dos termos ofensivos e da falta de compostura que marcam singularmente a Nota Oficial do MDS, a ANTC e a CNSP se solidarizam com os Auditores e também com o TCU, e esperam que o Governo Federal passe a receber com serenidade, urbanidade e bom senso as deliberações acerca de fiscalizações sobre políticas setoriais que visam não apenas auxiliar o Congresso Nacional no exercício de sua missão institucional prevista no artigo 49, inciso IX da Constituição da República, mas colaborar com o aperfeiçoamento da Administração Pública em prol dos anseios da sociedade.

Brasília, 11 de setembro de 2014.

DIRETORIA DA ANTC


Confira o inteiro teor da Nota Oficial do MDS:
Número de pobres no Brasil pode estar subestimado, aponta TCU;

Veja a repercussão das críticas na mídia:
Ministério reafirma dados sobre redução da pobreza e ataca TCU;
Dados do Bolsa Família podem estar distorcidos, revela TCU.

Imprimir   Email