TJ de Sergipe tranca sindicância contra o presidente da ANTC: “Coisa de quando da ditadura militar”

O Tribunal de Justiça do Estado de Sergipe decidiu, nesta quarta-feira (22), pelo encerramento de sindicância instaurada pelo presidente do Tribunal de Contas do Estado de Sergipe contra Ismar Viana, presidente da ANTC, que é Auditor de Controle Externo no órgão. O processo foi instaurado para, supostamente, apurar denúncia de ausência do Impetrante em dias de trabalho para participar de agendas da ANTC. Ocorre que, nas datas apuradas, Ismar Viana estava em período de férias e folgas registradas, conhecidas e autorizadas pelo próprio TCE-SE.

A decisão do TJ-SE reconhece a ilegalidade da sindicância.

Logo após a instauração, houve intensa mobilização da ANTC e de auditores de Controle Externo de todo o Brasil, que saíram em defesa de Ismar Viana, diante dos fatos que demonstravam que a sindicância era uma evidente retaliação a seu trabalho como representante nacional da carreira. 

No colegiado do TJ, a maioria a favor do trancamento da sindicância foi construída a partir de voto divergente do Desembargador convocado Manoel Costa Neto, que apontou diversas ilegalidades no processo instaurado pelo Presidente do TCE. 

Segundo ele, “a comissão se tornou um tribunal de exceção, na medida em que colocou o auditor à mercê de uma verdadeira devassa.”

“Mesmo em processos preparatórios, como é o caso da sindicância, é necessário respeitar, primeiro, o devido processo legal processual e, segundo, o princípio do devido processo legal material, que está no art. 8° do CPC, que traz reprodução de princípio normativo constitucional que a gente tem obrigação de cumprir”, argumentou Costa Neto. 

Ao acompanhar a divergência, o Desembargador Diógenes Barreto afirmou que a sindicância instaurada contra Ismar Viana lembrava “coisa de quando da ditadura militar”.

Maurício Gentil, advogado que representou Ismar Viana, classificou a sindicância como “ilegal” e “abusiva” e afirmou que o pedido de trancamento foi feito com base em diversos fundamentos jurídicos, entre os quais o fato de o processo não apresentar justa causa e não delimitar fatos concretos a serem objeto da eventual investigação.

“A sindicância determinava investigações genéricas sobre a vida funcional do auditor e isso foi considerado uma inadmissível e ilegal devassa em sua vida funcional. O Tribunal de Justiça, então, decidiu pelo trancamento, garantindo a Ismar Viana o direito de não se submeter ao constrangimento de uma sindicância flagrantemente ilegal e abusiva”. 

Entenda o caso

A sindicância instaurada pelo Presidente do TCE-SE foi um dos diversos acontecimentos no âmbito do Tribunal ocorridos após a decisão unânime do Supremo Tribunal Federal na Ação Direta de Inconstitucionalidade n° 6655, ajuizada pela ANTC. No dia 6 de maio, por unanimidade, o STF declarou a inconstitucionalidade de lei sergipana que estava permitindo, inclusive, comissionados nas unidades finalísticas de controle externo no TCE-SE. A ação foi ajuizada durante a gestão do ex-presidente Francisco Gominho (TCE-PE), que antecedeu a presidência de Ismar Viana, representante legal quando da decisão de mérito. 

No mesmo dia do encerramento do julgamento pelo STF, foram extraídos “Prints” do instagram da ANTC que constaram de uma denúncia anônima no Ministério Público de Sergipe, questionando seis participações do presidente da ANTC em reuniões com parlamentares, com ministro do TCU e para ministrar palestras em seminários sobre controle externo em Tribunais de Contas, por ocasião do Dia do Auditor de Controle Externo. 

Todas as participações se deram no legítimo exercício da representação nacional da classe e ainda se deram em períodos de férias e folgas regulares do presidente. 

A denúncia foi encaminhada ao TCE-SE e, após uma semana, o presidente do TCE de Sergipe exonera Viana da função de coordenador de gabinete e destitui a Comissão de Sindicância Administrativa então existente, designando comissão nova. No dia útil imediatamente subsequente, instaura sindicância no TCE-SE contra o presidente da ANTC.

No Ministério Público de Sergipe, a denúncia foi arquivada sumariamente, diante da “abundância e clareza solar” sobre a regularidade dos afastamentos para atuação em compromissos formais da ANTC - e que, ainda, aconteceram em períodos de férias e folgas regularmente concedidas pelo TCE. 

No TCE Sergipano, não encontrando nada no período denunciado, o presidente ampliou o escopo da sindicância para promover verdadeira devassa de mais de 40 meses da vida funcional do impetrante, também sem encontrar nenhum indício de falta funcional.

Na inicial do Mandado de Segurança, a defesa de Viana elencou todas as ilegalidades perpetradas, como a comissão de sindicância “ad hoc”, a devassa e a punição antecipada, demonstrando que os fatos configuram violação ao direito de liberdade associativa e de efetiva representação da classe nacional. 

“Do que se trata aqui,  em  boa  verdade, é de subversão do processo disciplinar, por meio de sindicância, para violar o direito à plena liberdade associativa do impetrante, que é presidente da Associação Nacional dos Auditores de Controle Externo dos Tribunais de Contas  do  Brasil  (ANTC),  legitimamente eleito por seus pares para representar a carreira que é composta por mais de 8.500 (oito mil e quinhentos) auditores de controle externo no Brasil”, diz trecho da inicial protocolada no Mandado de Segurança.

Em julho de 2022, foi concedida decisão liminar suspendendo a tramitação do procedimento. Na decisão, o desembargador reconheceu o “patente o cunho de perseguição”. 

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