ANÁLISE DE MINUTA DE PROPOSIÇÃO LEGISLATIVA PARA INSTITUIR REGIME EXTRAORDINÁRIO DIANTE DA PANDEMIA DO COVID-19

MINUTA DE PROPOSIÇÃO LEGISLATIVA (MIP) Nº 1/2020

   

COMENTÁRIOS TÉCNICOS E PROPOSTA ALTERNATIVA DA AUD-TCU

   

Institui regime extraordinário fiscal, financeiro e de contratações para enfrentamento da calamidade pública nacional decorrente de pandemia internacional e dá outras providências.

   

Lei Complementar pode instituir regime extraordinário fiscal, financeiro e lei ordinária ou lei complementar pode instituir o regime diferenciado de contratações para enfrentamento da calamidade pública nacional decorrente de pandemia internacional e dá outras providências.

Desnecessário PEC para disciplinar esses dois temas.

               

Art. 115. Durante a vigência de calamidade pública nacional, reconhecida pelo Congresso Nacional, e decorrente de pandemia de saúde pública de importância internacional, a União adotará regime extraordinário fiscal, financeiro e de contratações para atender as necessidades dela decorrentes, somente naquilo em que a urgência for incompatível com o regime regular, nos termos definidos neste artigo e em decreto legislativo.

   

Arts. 163 e 165, § 9º da CRFB conferem à União competência para legislar sobre calamidade pública, podendo ser editadas normas gerais específicas para disciplinar um regime extraordinário para as finanças públicas, dispondo sobre um regime orçamentário, financeiro e fiscal. Calamidade pública é tema previsto nos arts. 148, inciso I, e 167, § 3º da CRFB, que preveem fonte de recurso para o seu financiamento e possibilidade de abertura de créditos extraordinários por medida provisória.

O art. 22, inciso XXVII da CRFB confere à União competência privativa de estabelecer normas gerais de licitação e contratação, em todas as modalidades, para a administração pública, direta e indireta, incluídas as fundações instituídas e mantidas pelo Poder Público, nas diversas esferas de governo, e empresas sob seu controle. A matéria deve ser disciplinada por lei ordinária e o Presidente da República já editou a MPV nº 926/2020.

Desnecessário PEC para disciplinar esses dois temas.

               

§ 1º É instituído o Comitê de Gestão da Crise, com a competência de fixar a orientação geral e aprovar as ações que integrarão o escopo do regime emergencial; criar, eleger, destituir e fiscalizar subcomitês e a gestão de seus membros, podendo fixar-lhes atribuições; solicitar informações sobre quaisquer atos e contratos celebrados ou em via de celebração pela União e suas autarquias, empresas públicas e fundações públicas, com poder para anulá-los, revogá-los ou ratificá-los, dentre outras funções afins compatíveis com o escopo do regime emergencial, e a seguinte composição:

I – o Presidente da República, que o presidirá;
II – os ministros de Estado da Secretaria-Geral da Presidência da República, da Saúde, da Economia, da Cidadania, dos Transportes, da Agricultura e Abastecimento, da Justiça e Segurança Pública e da Controladoria-Geral da União;
III – dois secretários de saúde, dois secretários de fazenda e dois secretários da assistência social de estados ou do Distrito Federal, de diferentes regiões do País, escolhidos por entidades representativas, e sem direito a voto;
IV – dois secretários de saúde, dois secretários de fazenda e dois secretários da assistência social de municípios, de diferentes regiões do País, escolhidos por entidades representativas, e sem direito a voto;
V – quatro membros do Senado Federal, quatro da Câmara dos Deputados, um do Conselho Nacional de Justiça, um do Conselho Nacional do Ministério Público, e um do Tribunal de Contas da União, escolhidos pelas respectivas instituições e sem direito a voto.

   

O Presidente da República, com base nos arts. 61 e 84, inciso VI, alínea ‘a’ da CRFB, tem competência já prevista para instituir comitê no âmbito do Poder Executivo para ele próprio presidir, sendo desnecessário alterar a Constituição para tanto. Ademais, o art. 89 da CRFB prevê um Conselho da República, órgão superior de consulta da Presidência da República, que congrega a participação do Vice-Presidente, dos Presidentes da Câmara dos Deputados, do Senado Federal, de Líderes da maioria e minoria, do Ministro da Justiça e mais seis cidadãos. O Presidente da República pode convocar Ministros de Estado para participar das reuniões do Conselho (art. 90, § 1º).

O Senador José Serra apresentou Projeto de Decreto Legislativo para normatizar o funcionamento do Conselho da República durante a calamidade sanitária.

A composição do Conselho da República demonstra-se mais democrática, na medida em que envolve líderes da maioria e minoria, permitindo ao Presidente da República designar os Ministros de Estado das áreas afetadas e ao Congresso Nacional, por meio de suas Casas, indicar 4 integrantes, além de mais dois membros indicados pelo Presidente da República (art. 89, inciso VII, da CRFB).

Desnecessário PEC para disciplinar esse tema.

               

§ 2º O Presidente da República designará, dentre os ministros de Estado, o secretário executivo do comitê instituído pelo § 1º.

   

Desnecessário PEC para disciplinar esse tema.

               

§ 3º Eventuais conflitos federativos decorrentes da aplicação deste artigo serão resolvidos exclusivamente pelo Supremo Tribunal Federal.

   

O art. 102, inciso I, alínea f da CRFB já estabelece que questões envolvendo conflito federativo é matéria de competência originária do STF.Desnecessário PEC para dizer o que já está disciplinado.

Desnecessário PEC para disciplinar esse tema.

               

§ 4º Ato do Conselho de Gestão da Crise disporá sobre a contratação de pessoal, obras, serviços e compras, com propósito exclusivo de enfrentamento da calamidade e vigência restrita ao período de duração desta, que observará processo simplificado que assegure, sempre que possível, competição e igualdade de condições a todos os concorrentes; a contratação de que trata o inciso IX do art. 37 desta Constituição fica dispensada da observância do § 1º do art. 169 desta Constituição.

   

Requisitos orçamentários para contratação de pessoal é matéria já prevista no art. 169 da CRFB, tema de finanças públicas e orçamento que pode ser disciplinadas por lei complementar editada com fundamento nos arts.163, inciso I, e 165, § 9º da CRFB. Assim, lei complementar que disciplinar um regime diferenciado de contratação de pessoal para caso de calamidade pública pode dispor sobre exceções às exigências do § 1º do art. 169 da CRFB.

A Lei Federal nº 8.745, de 1993, foi alterada recentemente pela MPV 922, de 2020, assando a seguinte redação:

“Art. 5º As contratações serão feitas com observância à dotação orçamentária específica e com autorização prévia do Ministro de Estado da Economia e do Ministro de Estado sob cuja supervisão se encontre o órgão ou a entidade contratante, conforme estabelecido em ato do Poder Executivo federal. (Redação dada pela Medida Provisória nº 922, de 2020)

§ 2º O ato a que se refere o caput poderá estabelecer a dispensa de autorização prévia do Ministro de Estado da Economia nas hipóteses previstas no § 1º do art. 3º. (Incluído pela Medida Provisória nº 922, de 2020)”


A LDO-2020 (Lei nº 13.898, de 2019) já autoriza a contratação por tempo determinado, cumprindo a condição do art. 169, § 1º da CRFB, sendo necessário, tão somente, a abertura do crédito, o que pode ser feito por meio de crédito extraordinário aprovado por medida provisória (art. 167, § 3º da CRFB) ou envio de PLN ao Congresso Nacional. A LDO-2020 assim prevê:

“Art. 99. Para atendimento ao disposto no inciso II do § 1º do art. 169 da Constituição, observadas as disposições do inciso I do referido parágrafo e as condições estabelecidas no art. 96 desta Lei, ficam autorizados:
...
III - a contratação de pessoal por tempo determinado, quando caracterizarem substituição de servidores e empregados públicos, desde que comprovada a disponibilidade orçamentária;
...
Art. 105. Para apuração da despesa com pessoal prevista no art. 18 da Lei Complementar nº 101, de 2000 - Lei de Responsabilidade Fiscal, deverão ser incluídas aquelas relativas à contratação de pessoal por tempo determinado para atender à necessidade temporária de excepcional interesse público, nos termos do disposto na Lei nº 8.745, de 9 de dezembro de 1993, e as despesas com serviços de terceiros quando caracterizarem substituição de servidores e empregados públicos.” (grifei)


A despesa líquida total com pessoal da União, em 2019, ficou abaixo do limite máximo fixado pela LRF (50%), atingindo 31,63% da receita corrente líquida federal e 3,95% do PIB, parâmetro bem abaixo do verificado em 2002 (4,32% do PIB). Mesmo a despesa bruta com pessoal e encargos sociais da União se encontra abaixo dos patamares verificados em 1995 e 2000 (5,37% e 4,86% do PIB, respectivamente), tendo atingido 4,04% do PIB em 2019. Portanto, há espaço fiscal para contratação de pessoal por prazo determinado para o enfrentamento da calamidade pública.

Contratação de obras, serviços e compras, durante a calamidade pública, é matéria sujeita ao disciplinamento por lei ordinária, podendo o Presidente da República editar medida provisória para casos específicos e urgentes, a exemplo da MPV nº 926, de 2020. Não há necessidade de delegar competência privativa do Congresso Nacional para órgão administrativo legislar sobre contratação no plano infralegal, alijando a participação do Congresso Nacional na definição das normas que devem ser observadas por toda Federação, se o Congresso Nacional tem dado respostas rápidas na aprovação de leis pelo Plenário Virtual.

Desnecessário PEC para disciplinar esses temas.

               

§ 5º Desde que não se trate de despesa permanente, as proposições legislativas e os atos do Poder Executivo, com propósito exclusivo de enfrentamento da calamidade, e vigência e efeitos restritos ao período de duração desta, ficam dispensados do cumprimento das restrições constitucionais e legais quanto a criação, expansão ou aperfeiçoamento de ação governamental que acarrete aumento da despesa e a concessão ou ampliação de incentivo ou benefício de natureza tributária da qual decorra renúncia de receita.

   

Os arts. 16 e 17 da LRF disciplinam as normas para criação, expansão ou aperfeiçoamento da ação governamental e despesas obrigatórias de caráter continuado. A matéria se insere no contexto de finanças públicas e exceções para o período de calamidade pública podem ser disciplinadas por lei complementar editada com base nos arts. 163, inciso I, e 165, § 9º da CRFB.

Desnecessário PEC para disciplinar esse tema.

               

§ 6º Os créditos extraordinários destinados à finalidade referida no § 5º poderão ser abertos mediante a utilização de recursos vinculados legalmente a outras finalidades, inclusive do respectivo superávit financeiro e os decorrentes da realização de operações de crédito, e os da desvinculação de que trata o art. 76 deste Ato das Disposição Constitucionais Transitórias, exceto os recursos vinculados ao pagamento da dívida pública.

   

A vinculação de recursos à finalidade específica é mantida em outros exercícios por força do art. 8º, parágrafo único da LRF. A matéria se insere no contexto de finanças públicas e pode ser alterada por lei complementar, com exceção dos mínimos constitucionais de saúde e educação, sem razão para desvincular esses limites em momento de calamidade pública, sem um amplo e democrático debate com a sociedade, por meio do Plenário Virtual. Há saída na própria Constituição.

O art. 76 do ADCT já desvincula, até 2023, 30% das receitas da seguridade social, taxas e contribuições econômicas (CIDE). Uma vez desvinculados pelo dispositivo do ADCT, tais recursos podem ser utilizados em quaisquer finalidades, inclusive no custeio da própria seguridade social, notadamente as ações de saúde e assistência social necessárias em período de calamidade pública de natureza sanitária.

Em 2019, a seguridade social (stricto sensu) dispôs de receitas da ordem de R$ 713,9 bilhões (RGPS e contribuições da seguridade social previstas no art. 195 da CRFB) contra despesas R$ 939,8 bilhões com benefícios do RGPS (R$ 628,5 bilhões), saúde (R$ 122,3 bilhões), assistência social (R$ 95,9 bilhões), abono-salarial (R$ 17,5 bilhões), seguro-desemprego (R$ 37,4 bilhões) e demais despesas da seguridade social (R$ 38,2 bilhões), segundo dados do Tesouro Nacional2(pág:43). Não foram consideradas as receitas e despesas do regime próprio de previdência dos servidores civis e militares da União.

Dessa forma, não há espaço no orçamento da seguridade social para desvinculações. Atualmente, o orçamento da seguridade social é que necessita de financiamento oriundo do orçamento fiscal ou da instituição de novas fontes, a exemplo do empréstimo compulsório previsto no art. 148, inciso I, da CRFB para custear despesas decorrentes de calamidade pública.

Destinação do superavit financeiro é matéria que se insere no contexto de finanças públicas e exceções para o período de calamidade pública podem ser disciplinadas por lei complementar editada com base nos arts. 163, inciso I, e 165, § 9º da CRFB.

Desnecessário PEC para disciplinar esse tema.

               

§ 7º Durante a vigência da calamidade pública nacional de que trata o caput, os recursos decorrentes de operações de crédito realizadas para o refinanciamento da dívida mobiliária poderão ser utilizados também para o pagamento de seus juros e encargos.

   

Matéria se insere no contexto do art. 163 da CRFB que exige lei complementar para disciplinar normas gerais de finanças públicas (inciso I), dívida pública externa e interna, incluída a das autarquias, fundações e demais entidades controladas pelo Poder Público (inciso II) e emissão e resgate de títulos da dívida pública (inciso IV).

A Lei nº 10.179, de 2001, disciplina uma série de regras sobre os títulos da dívida pública de responsabilidade do Tesouro Nacional, consolidando a legislação sobre a matéria, no que invade, em algumas passagens, matérias sujeitas à lei complementar por força dos arts. 163, inciso I e IV da CRFB.

Desnecessário PEC para disciplinar esse tema.

               

§ 8º Será dispensada, durante a integralidade do exercício financeiro em que vigore a calamidade pública, a observância do disposto no inciso III do art. 167 desta Constituição.

   

O Congresso Nacional pode disciplinar a matéria por maioria absoluta. Em 2019, a União descumpriu, em R$ 185 bilhões, a regra de ouro prevista no art. 167, inciso III da CRFB, o que levou o Congresso Nacional aprovar a Lei nº 13.843, de 17/06/2019, por meio da qual foi aberto um crédito de R$ 248,9 bilhões, exigindo-se, tão somente, maioria absoluta. A matéria se insere no Capítulo das Finanças Públicas e o Congresso Nacional pode autorizar previamente, por lei complementar que regulamente o regime diferenciado de finanças públicas (art. 163, inciso I, da CRFB), que o Poder Executivo está autorizado a realizar operações de crédito em montante superior ao das despesas de capital, como o fez em 2019 por meio de lei ordinária.

Desnecessário PEC para disciplinar esse tema.

               

§ 9º O Congresso Nacional se manifestará quanto à pertinência temática e a urgência dos créditos extraordinários destinados à finalidade referida no § 6º em vinte dias úteis, contados da edição da medida provisória, sem prejuízo de sua regular tramitação.

   

Matéria pode ser disciplinada em lei ou no Regimento Interno do Congresso Nacional, que tem atuado de forma exemplar no enfrentamento aos desafios da crise sanitária do coronavírus.

Desnecessário PEC para disciplinar esse tema.

               

§ 10 O Banco Central, limitado ao enfrentamento da referida calamidade, e com vigência e efeitos restritos ao período de duração desta, fica autorizado a comprar e vender direitos creditórios e títulos privados de crédito em mercados secundários, no âmbito de mercados financeiros, de capitais e de pagamentos.

§ 11 O montante total de compras de cada operação do Banco Central na hipótese do § 10:

I – deverá ser autorizado pela Secretaria do Tesouro Nacional e imediatamente informado ao Congresso Nacional; e

II – requer aporte de capital de pelo menos vinte e cinco por cento pelo Tesouro Nacional.

   

A compra e venda de direitos creditórios e títulos privados de crédito em mercados secundários é matéria complexa, com risco elevado e que merece um debate mais amplo. Entretanto, se for da vontade do Congresso Nacional discutir a matéria, isso pode ocorrer em sede de lei complementar com fundamento no art. 163, incisos I e IV da CRFB, além do art. 165, § 9º para disciplinar regras orçamentárias específicas para o período da calamidade pública nacional em razão de crise sanitária.

A questão do fórum adequado se resolve, sem assombro, com eventuais regras excepcionais, se for o caso, em complemento aos arts. 26 a 28 da LRF. Com esta manifestação, a AUD-TCU não está defendendo, tampouco rechaçando, a ideia de compra e venda de títulos privados de crédito em mercado secundário. A análise realizada, de forma perfunctória, diz respeito à via legislativa anunciada, sendo certo que não há necessidade de emenda à Constituição para esse debate.

Caso o Congresso Nacional entenda pela regulamentação da matéria, a AUD-TCU é de opinião que deve o Tesouro Nacional ser a autoridade fiscal responsável por eventuais compra e venda de direitos creditórios e títulos privados de crédito em mercados secundários.

O Bacen tem como missão a solvência do Sistema Financeiro Nacional (SFN). Títulos de empresas nãofinanceiras não devem ser adquiridos pelo Bacen, porque tais empresas não afetam a solvência do SFN. A questão deve ser debatida e eventualmente conduzida pela autoridade fiscal, jamais pela autoridade monetária.

Caso seja necessário emitir moeda, em situação extrema, o Bacen, na condição de autoridade monetária, pode emitir com fundamento no art. 164 da CRFB e da lei complementar prevista no art. 192, repassando ao Tesouro Nacional, para que este, com transparência, informe à sociedade sobre os atos praticados e sua execução.

Oportuno relembrar que a delegação desse tipo de competência ao Bacen tem o risco de ressurgimento do orçamento monetário, que já gerou descrédito ao orçamento geral da União (OGU). Na prática, o Congresso Nacional deixaria de legislar sobre matéria financeira de densa relevância. Segundo estudos3 , o orçamento monetário, cuja prática foi disseminada na década de setenta, funcionava como uma ferramenta de controle do passivo monetário e não-monetário que era utilizado, de uma forma geral, para política cambial, subsídios, linhas de crédito, dentre outros programas instituído à margem do Congresso Nacional.

Nesse modelo, não há como se proceder um controle eficaz da política monetária e do endividamento público. A utilização da autoridade monetária como bancos de fomento já foi experimentada na década de setenta e fracassou.

A autoridade monetária não opera segundo o mesmo padrão de transparência do Tesouro Nacional, e nem se pode exigir isso daquela autoridade. Atualmente, tramita no Senado Federal o PLS 19, de 2019, para regulamentar a autonomia do Bacen e não se deve confundir os papéis.

Desnecessário PEC para disciplinar esse tema.

               

§ 12 Ressalvada a competência originária do Supremo Tribunal Federal, do Tribunal Superior do Trabalho, do Tribunal Superior Eleitoral e do Superior Tribunal Militar, todas as ações judiciais contra decisões do Comitê de Gestão da Crise serão da competência do Superior Tribunal de Justiça.

   

A proposta suprime todas as demais instâncias do Poder Judiciário abaixo do STJ. Da mesma forma, suprime-se a atuação descentralizada do Ministério Público, com a concentração de funções na figura do Procurador-Geral da República, burocratizando o processo e tornando-o mais lento, na medida em que impede a ágil adoção de medidas urgentes pelos representantes do Ministério Público Federal, através de seus representantes que atuam em todo o país, próximos e conhecedores das realidades locais.

O texto proposto, como ressaltado em Nota Conjunta4 assinada por entidades que representam os Ministério Públicos, Auditoria de Controle Externo e servidores públicos, desconsidera que a Constituição de 1988 inaugurou um sistema jurídico nacional e que os órgãos dos sistemas de Justiça já dispõem de suficientes instrumentos técnicos e parâmetros legais adequados e em pleno vigor, além de senso de responsabilidade, para adotar as melhores práticas e soluções necessárias ao imenso esforço coletivo que o momento exige, em prol da sociedade brasileira, de suas instituições e de sua sobrevivência, não sendo necessária a aprovação de nenhum outro normativo para tanto, especialmente se eivado de inconstitucionalidade.

Desnecessário PEC para disciplinar esse tema.

               

§ 13 O Tribunal de Contas da União fiscalizará os atos de gestão do Comitê de Gestão da Crise, bem como apreciará a prestação de contas, de maneira simplificada, no prazo de trinta dias, contados a partir da apresentação do relatório.

   

O art. 71 da CRFB já disciplina a competência do TCU.

O art. 73 da CRFB confere ao TCU competência para aprovar seu regimento interno e a Corte de Contas tem demonstrado comprometimento no trato das ações de controle externo neste período de calamidade pública. Questão pode ser resolvida com resolução do TCU que formalize um rito processual abreviado, o que já vem sendo feito na prática.

Desnecessário PEC para disciplinar esse tema.

               

§ 14. Todas as atas, decisões e documentos examinados e produzidos pelo Comitê de Gestão da Crise e pelos subcomitês que vierem a ser instituídos, assim como todas as impugnações e as respectivas decisões, serão amplamente divulgados detalhada e regionalmente nos portais de transparência dos poderes Executivo e Legislativo e no do Tribunal de Contas da União, sendo vedado o seu sigilo sob qualquer argumento

   

O direito ao acesso a informação está previsto no inciso XXXIII do art. 5º, no inciso II do § 3º do art. 37 e no § 2º do art. 216 da CRFB. A matéria encontra-se disciplinada nos arts. 48 e 48-A as LRF e a Lei de Acesso à Informação (Lei nº 12.527, de 2011).

Regras específicas para o período da calamidade pública pode ser disciplinada por decreto legislativo, lei ordinária e lei complementar.

Desnecessário PEC para disciplinar esse tema.

               

§ 15. O Congresso Nacional poderá sustar qualquer decisão do Comitê Gestor da Crise ou do Banco Central em caso de ofensa ao interesse público ou de extrapolação aos limites deste artigo.

   

O Congresso Nacional é competente para “fiscalizar e controlar, diretamente, ou por qualquer de suas Casas, os atos do Poder Executivo, incluídos os da administração indireta” (art. 49, inciso X da CRFB).

O Art. 71, § 1º da CRFB já prevê que, no “caso de contrato, o ato de sustação será adotado diretamente pelo Congresso Nacional, que solicitará, de imediato, ao Poder Executivo as medidas cabíveis”. E, se “o Congresso Nacional ou o Poder Executivo, no prazo de noventa dias, não efetivar as medidas previstas no parágrafo anterior, o Tribunal decidirá a respeito” (art. 71, § 2º).

A Comissão Mista de Orçamento (CMO) é competente para, “diante de indícios de despesas não autorizadas, ainda que sob a forma de investimentos não programados ou de subsídios não aprovados, poderá solicitar à autoridade governamental responsável que, no prazo de cinco dias, preste os esclarecimentos necessários” (art. 72, caput) da CRFB).

A CMO pode solicitar ao TCU pronunciamento conclusivo caso a autoridade governamental não preste os esclarecimentos requeridos (art. 72, § 1º, da CRFB). O TCU já adota rito abreviado para solicitações do Congresso Nacional conforme previsto seu Regimento Interno.

Entendendo o Tribunal irregular a despesa, a CMO, se julgar que o gasto possa causar dano irreparável ou grave lesão à economia pública, “proporá ao Congresso Nacional sua sustação” (art. 72, § 2º da CRFB).

Desnecessário PEC para disciplinar esse tema.

               

Art. 164-A. O Banco Central fica autorizado a acolher depósitos voluntários à vista ou a prazo das instituições financeiras, com prazo máximo de doze meses.

   

O art. 192 da CRFB estabelece que o sistema financeiro nacional será regulado por leis complementares. Atualmente, o Bacen é regido pela Lei nº 4.595, de 1964, que a jurisprudência do STF reconhece o status de lei complementar para os temas que a Carta Política exige quórum especial para tanto. A Lei assim estabelece:

“Art. 4º Compete ao Conselho Monetário Nacional, segundo diretrizes estabelecidas pelo Presidente da República:
...
XIV - Determinar recolhimento de até 60% (sessenta por cento) do total dos depósitos e/ou outros títulos contábeis das instituições financeiras, seja na forma de subscrição de letras ou obrigações do Tesouro Nacional ou compra de títulos da Dívida Pública Federal, seja através de recolhimento em espécie, em ambos os casos entregues ao Banco Central do Brasil, na forma e condições que o Conselho Monetário Nacional determinar, podendo este:
...
Art. 10. Compete privativamente ao Banco Central da República do Brasil:
...
V - Realizar operações de redesconto e empréstimos a instituições financeiras bancárias e as referidas no Art. 4º, inciso XIV, letra " b ", e no § 4º do Art. 49 desta lei;”


Novas hipóteses de depósito, a exemplo do depósito voluntário que se pretende instituir por emenda constitucional, poderá ser disciplinada por lei complementar com fundamento no art. 192 da CRFB.

Desnecessário PEC para disciplinar esse tema.

   

Ofício nº 019/2020-AUD-TCU.


Fonte: Comunicação ANTC.

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